Voltando da faculdade pra casa, lá pelas 7:30 da noite mas com pleno sol, passei por dois sujeitos, sentados, que falaram, “Good afternoon, young lady”. O young lady me deixou feliz, claro. Daí refleti como os homens de Detroit, em geral, são bem educados. Tudo bem, depende da idade – os mais jovens parecem revoltados, como tantos jovens em tantos lugares. E também não sei como esses dois sujeitos que me falaram boa tarde se comportariam com alguém da cor deles. É que a segregação aqui é tão grande que tenho a impressão que negros não desejam brancas, e vice versa (no momento estou meio amarela, com cabelo black power dos anos 70 pra ninguém botar defeito). Ok, tem os loucos, que são muitos. E digo loucos literalmente. Desses que andam na rua não apenas falando com eles próprios, mas gritando e se auto-xingando. E aí eles se cansam de brigar com eles mesmos e quebram uma garrafa e partem pra cima de você. Já aconteceu comigo. Me contaram, e eu acredito, que vários hospícios fecharam por falta de verba (saúde pública nos EUA é inexistente; veja o fantástico Sicko – SOS Saúde, do Michael Moore). E os internos foram simplesmente jogados na rua. Mas os não-loucos são gentis. Como eu e o maridão andamos de mãos dadas, é frequente alguém passar e falar, sem nenhum sarcasmo, “Ah! That's true love!” (oh, isso é amor de verdade). Pelo jeito somos o único casal caquético do universo a andar de mãos dadas e, às vezes, abraçados (geralmente um se apoiando no outro pra não cair). O zelador do prédio só diz: “Hello, lovers!” (olá amantes/namorados/pombinhos?). A primeira vez que ele falou isso eu pensei: “Ish, será que as paredes do nosso apê são finas demais e calhou de alguém passar no corredor bem quando, no Natal, o título de 'lovers' seria justo?”. Mas agora já me acostumei com o “Hello, lovers!” do zelador.
Eu e o maridão estávamos na principal praça da universidade, alimentando os esquilinhos, quando passaram dois rapazes bonitos. Sorridentes, eles disseram Good afternoon pra gente, a gente respondeu, e eles decidiram falar conosco. Só aí percebi que as roupas formais eram esquisitas pra meninos da idade deles. “Não quero afugentar o seu esquilo”, ele começou, e eu gostei que ele reconheceu que o esquilinho aos meus pés tinha dona, “Mas aqui tem um papel, e com esse papel você pode pedir o livro tal. Esse livro mudou a minha vida”. Agradecemos, e eles foram embora, felizes de ter cumprido o que sua religião manda – não basta acreditar, tem que aumentar o rebanho. Eram mórmons. Eu tive que falar pro maridão: “Por que, ó Senhor, por que fazer dois carinhas tão lindinhos gente tão religiosa? Por que eles não podem ser adeptos do amor livre?”. O maridão ainda estava na parte do “seu esquilo”.
E por falar em esquilos, desta vez pegamos um maníaco. Tão maníaco que, mesmo depois de ter devorado ou enterrado uns dez amendoins, ainda partiu pra cima de outro esquilo que queria um reles amendoinzinho. Eu apelidei o maníaco de Coringa. Esse não tinha o menor medo da gente. Pelo contrário. Se a gente demorava meio segundo pra dar o amendoim seguinte pra ele, ele já ficava em duas patinhas, nos encarando, quase ameaçando subir nas nossas pernas e escalar até as nossas mãos. Todo mundo passava e falava “How cute!”, mas eu sabia a verdade. Tanto que falei pra ele: “Ó, você pode estar fazendo o maior sucesso entre os humanos, mas desconfio que você não seja muito popular entre seus colegas esquilinhos”. Ele não ouviu e exigiu o próximo amendoim. Quando ele pisou no pé do maridão, ele (humano) até teve de dizer: “Cuidado, tá?! Eu sou maior que você!”. Mas ainda assim achamos de bom tom ir embora. Discretamente, pra ninguém captar o terror em nossos olhos.
28 comentários:
Hahahahahahahah Lola adorei!
Fatima.
Adorei este esquilo psicopata, me lembra a Ema que confundiu o dedo da Ciça com um floco de ração, no Zôo Safari rsrsrsrs
Eu também me espanto quando vejo/encontro pessoas cordiais na rua. Eu sou naturalmente cordeal, digo bom dia, boa tarde, mas as pessoas sempre me olham com aquele olhar de 'o que você quer' e eu acabo por relaxar nos modos.
Aliás, coisa estranha... no prédio antigo, de 10 apartamentos, todos se conheciam por nome mas evitavam se encontrar nos elevadores. Já no prédio novo, com 10 por ANDAR, as pessoas se cumprimentam, entram juntas no elevador, perguntam se somos novos, por aí vai. Assustador. ;)
Beijos
Lola agora é que notei sua foto na home! Que cosa masi lindaaaaaaaaaa!
Leu o meu e-mail?
Fatima.
Lolaa!
Gostei muito!
Me dá um esquilo de estimação pra brincar com meu pinsher?
^^
Lola, você pode me tirar uma dúvida?
Ontem eu fui ao festival internacional de curtas-metragens de são paulo... E Você consegue me responder pq quase tdos os curtas são iguais ao programa do ratinho?
(entra no blog se puder...depois... q lá explica melhor...)
Os internacionais não são muito assim néh?
Pq acontece mais no Brasil?
Beijooooo!
Lola, o seu senso de humor é impagável. Detroit certamente perdeu um pouco da graça depois que você retornou ao Brasil. By the way, eu pensei que sua terra natal fosse Santa catarina, mas depois do post sobre a origem de seu desejo em tornar-se crítica de cinema - particularmente a menção ao apartamento no Leblon - vi que você é mais cidadã do mundo do que supunha a minha vã filosofia. Fiquei curiosa...
Eu moro em Washington e também estou finalizando a minha tese de Doutorado. Aliás, Lola querida, quando você vai nos brindar com um post sobre a sua saga acadêmica? Menina, isso seria bom demais!
Beijos,
Rosangela
Essa sua foto... Dá vontade de dar uma dentada nessa mão gorduchinha.
Yummi! Ainda bem que eu tenho um exemplar desses em casa!
:o)
Lola, vc está comendo um sanduiche-iche-iche imaginário na foto?
XD
Outro dia eu estava passando pela frente de uma locadora e alguém perguntou:
"Tem sicho, com Roger Moore?", segurei o riso, e gargalhei em casa...
Cordialidade é coisa rara hoje em dia, especialmente nas grandes cidades.
Quanto aos esquilos, o mais próximo que já cheguei foi assitindo Chip 'n Dale (Tico e Teco)...
Uhu! Primeiro lugar entre os que mais comentam!
Trabalhar? Pra que trabalhar?
Yes! Vagabundagem da cabeça!
Ai, que vergonha...!
Onde eu moro tem umas patrulhas de mormons, sempre em dupla, tentando puxar conversa e panfletando. Das garotas sempre nos param (eu e o namorado), tentam convencer a gente a dar os nossos celulares, aquela coisa. Semana passada, felizmente, elas so' passaram pela gente e disserem um oi animadissimo, como se fossem nossas amigonas.
Depois da quarta vez que te abordam e voce tem que explicar que nao esta' interessada em trocar de religiao comecam a aflorar umas ideias violentas no cantinho da mente, mas continuamos a ser educados mesmo assim.
"Trabalhar? Pra que trabalhar?
Yes! Vagabundagem da cabeça!"
Enquanto eu espero a lesma do pc fazer os cálculos eu entro aqui, fácil fácil, nada de vagabundagem...
Fátima, querida, que bom que vc gostou, do banner (que a Suzana fez, tão gentilmente) e do texto.
Ha, Chris, não pensa que não me lembrei do esquilo da Ciça ao reler este texto.
Eu acho legal quando todo mundo se cumprimenta, imitando cidade pequena. Não custa nada, e faz com que a gente se sinta parte de uma comunidade. Ai, quero escrever um post sobre isso. Mas não vai ser pra já.
Bobby, pelo que vi nos States, é bem difícil pra cães e esquilos serem amigos. Quando aparece qualquer cão, independente do tamanho, os esquilos sobem na árvore. Agora, se fosse uma briga entre pinscher e esquilo, eu apostava no esquilo, tá?
Depois entro no seu blog pra saber o que vc tá aprontando! Falando mal dos curtas brasileiros agora? O Ratinho tá vivo ainda?
Obrigada pelos elogios, Rosangela! Eu sou uma cidadã do mundo: nasci em Buenos Aires, vim pro Brasil com 3 anos e pouco, vivi 6 anos no Rio, 16 em SP, 1 em Detroit, e uns 14 ou 15 em Joinville (e Floripa também, lá e cá). E sabe-se lá qual será minha próxima parada. Gostaria que fosse alguma capital nordestina!
Puxa, vc já tá finalizando seu doutorado? Pra mim ainda falta quase um ano sofrido! No que é o seu doc? Algum dia eu escrevo sobre a minha saga, mas só depois de acabar. Sabe como é, pra ter humor é necessário um certo distanciamento - tragédia + tempo. Por enquanto estou só na tragédia.
Mão gordinha, Su? Mão gordinha eu tenho agora! Quando criança eu era bem magrinha. Depois colocarei outras fotos pra vc ver. Eu tinha ossos!
Bobby, parece mesmo que eu tô comendo um sanduíche imaginário na foto, né? Ou pode ser eu falando com um auto-falante. (ish, alto-falante ou auto-falante? Essas dúvidas me perseguem!).
Gio, Sicho é fogo. Mas eu não devo saber pronunciar Sicko corretamente em inglês, porque toda vez que comentava o filme com o meu co-orientador nos States, ele não entendia. E o Roger Moore tá aposentado! Pois é, pra minha infelicidade, descobri que Chico e Teco não são esquilos, mas chipmunks! Fomos enganados! (mas acho que, por aqui não termos esquilos, as pessoas não ficam tão apegadas a detalhes. O filme infantil “Alvin and the Chipmunks” tá saindo em dvd aqui como o título “Alvin e os Esquilos” mesmo. Mas há grandes diferenças!).
Su, ser a top comentarista do blog é fichinha em matéria de vagabundagem! E ter um blog com posts diários, todo santo dia, faz 8 meses, sem faltar um diazinho sequer, quando a pessoa deveria estar se dedicando exclusivamente à tese? Isso é pior! Mas eu adoro todos os meus leitores “vagabundos”.
É, Cereja, entendo os pensamentos homicidas. Eu odeio quando batem palmas aqui em casa. Eu não atendo mais. Já fui super paciente, já conversei com as pessoas, expliquei que não sou religiosa. Mas agora tenho tanta paciência com eles quanto tenho com vendedores – nenhuma. Agora, se é uma pessoa que chega pra mim numa praça, na rua, no ônibus, depende do meu humor. Às vezes digo “Não, obrigada” - aconteceu semana retrasada num ônibus, em que uma crente tava tentando distribuir a palavra de Jesus, e várias pessoas recusavam, e ela perguntou: “Por que vcs não querem a palavra de Jesus?”. Às vezes aceito o negócio. Mas no caso desses mormons em Detroit, eles eram tão bonitinhos, e estavam tão contentes e animados, que seria um pecado recusar. E o carinha ainda falou “seu esquilo”! Eu quase compraria uma bíblia usada dele.
Que cálculos, Gio? Não me diga que vc é contador!
Há um ano eu teria respondido que "vagabundo é a mãe" mas agora até acho legal. Ficar só na vagabundagem é bão demais, sô!
Minha patroa adora andar de mãos dadas, mas eu só faço quando estamos longe dos meus amigos. Eles dizem que eu dou mau exemplo... as deles vão ver e vão querer a mesma coisa. :)
Agora o blog do maridão tá legal, obrigado pela força!
Esqueci de dizer: você "era" uma gracinha...
Eu também sempre viajei nessa onda de chipmunk x squirrel, principalmente pq não Tâmia é coisa que nunca se fala por essas bandas...
Alvin e os esquilos é muito chato, comprei pro meu filho que nem olha, pensei que tivesse alguma coisa a ver com a serie de desenhos...
Não sou contador não, sou cientista político, mas não trabalho (diretamente) com eleições e coisas do gênero, a minha área é análise de políticas públicas, que tem algo de acountability, mas como estatística.
O que raios é um Chipmunck? Quero dizer, se o Tico e o Teco não são esquilos, qual a tradução correta para o português? Qual a versão real dos bichinhos?
Amei o novo banner. Ficou lindo!!!! A sua cara, hehehehe.
Sei lá, acho que por tê-la conhecido em Joinville, para mim você é Joinvillense e tá acabado. Não consigo imaginar você como 'sendo' de outro lugar.
Ah! Estava pensando em voltar a estudar inglês (sabe, meu sonho de vida é ser tradutora) e dei uma bisolhada na Cultura Inglesa. Não sei se terei fundos para estudar agora (:-(), mas...acha melhor eu tentar o Cultura mesmo ou aula particular? Conhece algum professor realmente bom aqui em Floripa?
"O que raios é um Chipmunck? Quero dizer, se o Tico e o Teco não são esquilos, qual a tradução correta para o português? Qual a versão real dos bichinhos?"
A tradução oficial é Tâmia, mas pra gente é tudo esquilo mermo
Ix, nunca tinha ouvido falar em Tâmia! Acho que tenho que pesquisar para ver uma foto 'original' dos bichinhos ^_^.
Obrigada.
Tâmia? Sério?!?!?! Caracas, eu ia morrer sem saber disso... Mas Squirrels são os "normais", de rabinho comprido, que a gente vê na região serrana do Rio, no Central Park e eafins, é isso, né?
Enfim, voltei aqui para dizer que AMEI a fotinha da Lola no header, e que ainda estou fazendo um layout bem legal, e ví que váááárias pessoas já comentaram a respeito. Sou muito leza, fala sério!
Beijos
Uuauuuuuuuu que tri legal!
Fazem 2 horas e vinte minutos que Lola está ausente do blog.
Psssssssiiiuuuuuuu! Acho que ela tá na tese. Sairei pé por pé.
Mario Sergio, eu não me incomodaria nem um pouco de ser uma vagabunda. Claro que isso tem conotação diferente pra homem e pra mulher. Gostaria de ser vagabunda no sentido masculino. Fala pra sua esposa entrar no meu blog, Mario! Eu posso ajudá-la a tentar colocar vc na linha. Que é isso de só andar de mãos dadas com ela longe dos seus amigos? Como que pode? Tsc tsc. Viu? Se eu não desse bronca, o blog do maridão estaria mortão!
E não pense que eu levo o “Vc era uma gracinha” a mal. Uma vez na escola de inglês onde eu dava aula e era coordenadora fizemos essa brincadeira de colocar fotos dos professores quando bebês/crianças pros alunos chutarem quem é quem. Minha foto fez muito sucesso, claro, e um aluno meu, muito engraçado, virou pra mim e perguntou: “Vc era essa? O que aconteceu?!”. Ah, eu cresci! Primeiro vieram as espinhas (que estão aqui até hoje). Depois umas banhinhas (idem). E já falei das olheiras? Mas olha, tem um monte de moças levantando a minha bola ultimamente. Faz tempo que não ouço tantas almas abençoadas falando “Vc é linda!” ao mesmo tempo. Homem que é bom, nada...
É, Gio, quando eu fui escrever sobre chipmunks vi que a tradução era tâmia. Nunca tinha ouvido essa palavra antes! Mas é aquele negócio: a gente usa as palavras pra descrever o que vemos e sentimos. Como aqui não tem chipmunks, por que usaríamos tâmia? Eu li que Alvin e os Esquilos é uma bomba. Claro que eu não tenho filhos, logo não veria isso nem que dissessem que é uma obra-prima. Cientista político?! Que legal, Gio. Como tá o panorama político aí no Recife? Quem vai levar as eleições? Vc bem que podia escrever sobre isso no seu blog. Ou vc só escreve sobre bebida? Eu me sinto bem por fora da corrida política nas capitais, e gostaria de saber o que tá acontecendo. A Paula do Palimpsesto fez o favor de me explicar o que tá pegando em Porto Alegre.
Miquinha, e quando eu me mudar de Joinville? Vou continuar sendo “joinvilense e tá acabado”? Sobre suas aulas de inglês, como vc sabe, Mica, professor particular é muito mais caro. Não sei como é o mercado aí em Floripa. Eu conheço ótimas professoras, mas todas estão com o horário cheio, eu acho. Dá pra aprender inglês também numa escola, Mica. Depende muito da sua dedicação. Vc já tá no nível intermediário? Deve estar, com todas as séries que assiste...
Chris, eu acho que vi chipmunks nos States apenas uma vez. Eles são menores que os esquilos, e listrados. Fofíssimos tb. Um dia eu vi uma espécie que não era nem esquilo nem chipmunk, e não tenho idéia do que era. Era minúsculo, listrado, bem diferente de esquilo, porque duvido que ficasse em duas patas ou sequer subisse em árvore. Lindão! E ele armazenava os amendoims em suas bochechas, como um hamster. Mas não tinha nada a ver com hamster! Nunca vi um bichinho daqueles.
Não entendi, vc tá bolando um banner pra mim? Aceito todos! Eu quero mudar de vez em quando, variar. Não precisa ser um definitivo.
Fátima, obrigada pela torcida. Mas a tese não tá indo nada bem...
Lola uma vez numa aula de Semiótica
um doutor que havia estudado com
Umberto Eco,(seria Ecco?) disse algo mais ou menos assim: há uma descoberta de um novo conhecimento um novo saber, que se processa no ato instantâneo/paralelo em que desenvolvemos uma idéia.
Não lembro literalmente como era a descrição conceitual do fenômeno
(que ocorria eu creio, sob a ótica saussoureana, digamos assim ...ih ih ih ih !)
Bom, depois deste dia compreendi por que era que: quando eu postergava (ui!)um afazer intelectual, só na hora da pressão do último segundo, a coisa fluía.
De repente voce tá com essa tese,
que (talvez seja grande)entalada,
e, num dado momento, num átimo de
premência da vigésima quarta hora... hás de parir!
Continuarei no plantão da torcida.
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