quarta-feira, 18 de junho de 2008

YES WE CAN – NÓS NO COMÍCIO DO OBAMA

Anteontem fomos a um rally, que não tem nada a ver com carro. É um comício. Foi a primeira vez na campanha que Barack Obama esteve em Detroit, e a demora pra prestigiar uma de suas grandes bases de apoio já estava deixando o pessoal de Michigan impaciente. Fomos eu, o maridão, e duas amigas brasileiras, a Andie e a Carol. Quem nos avisou foi a Ju, que morou aqui ano passado, por seis meses. Como que ela, que tá em Floripa, sabia, e a gente não?

O comício foi num grande estádio esportivo no centro. Chegamos às seis da tarde. As portas do estádio abririam às seis e meia, e o Obama tava marcado pra começar a discursar duas horas depois. Pegamos uma das maiores filas que já peguei na vida. Sabe dessas filas que não se consegue ver o final? Uma dessas. Mas o tempo estava agradável e tivemos a companhia do belo rio que separa Detroit do Canadá (de Windsor, mais especificamente), com todo seu verde e suas gaivotas. Havia também algo esquisito lá: uma espécie de canudo que parecia nos seguir de dentro do rio. Tinha toda a pinta de ser um tubo, com um mergulhador nadando embaixo, só que não era. E tampouco era uma sujeirinha, até porque estava indo contra o vento. Teóricas da conspiração que somos, imaginamos que era uma câmera do governo. Gostaria de contar pra vocês o que era de fato, mas não faço a mínima. Ah sim, lá na fila, várias pessoas vendiam camisetas e buttons do Obama, outras pediam pra assinar petições, e a maior parte vinha perguntar se estávamos registradas pra votar (já que o voto nos EUA não é obrigatório).

Na entrada do estádio, muitos detectores de metal e guardas. Revistaram todas as bolsas, celulares e câmeras fotográficas. E não deixaram entrar o guarda-chuva portátil da Carol! Ele foi detido e ficou lá ao lado da segurança, que não deu garantia nenhuma de que ele estaria lá no fim do comício. Mas felizmente estava, pra grande alívio da Carol. Também não se podia entrar com nada líquido, o que fez com que pessoas deixassem um cemitério de garrafas de água e latinhas nas escadas. Mas havia lojas lá dentro (com filas grandes também).

O estádio lotou, e parece que havia lá umas 20 mil pessoas muito entusiasmadas pra ver o Obama. O grito de guerra, um tanto estúpido, digamos, pois pode ser usado pra qualquer situação, era “Yes we can!” (“Sim, nós podemos”). Enquanto esperávamos, os organizadores distribuíram cartazes, inclusive cartazes feitos à mão, para quem estava sentado nas primeiras filas, logo atrás do palco. Eu, ingênua, pensei que quem trazia um cartaz do tipo “Veterans for Obama” (“Veteranos de guerra com Obama”) era um veterano, ué. Mas não é. Na nossa frente havia um casal (branco) com filhinho pré-adolescente, todos muito afoitos e cheios de câmeras. Era interessante porque qualquer coisinha o menino não apenas se levantava como fazia um gesto com os braços pra que todos se levantassem também. Estávamos meio longe do palco, mas dava pra ver tudo através de um dos quatro telões.

Primeiro apareceu no palco um casal (negro), que pediu contribuições pra campanha e fez com que quem tivesse celular (todo mundo menos eu e o maridão) digitasse um número pra poder acompanhar o dia a dia da candidatura. Depois a governadora de Michigan discursou. Foi muito vaiada no começo (porque a economia do Estado não vai nada bem), mas acabou levantando a platéia ao dizer que Michigan vai conseguir se erguer assim que começar a liderar as alternativas de transporte aos carros movidos a petróleo. O público não perdoou quando ela disse que apoiou Hillary Clinton nas primárias, mas que agora está 100% com Obama, e que fará uma diferença enorme à economia estadual ter um governo federal amigo, ao contrário dos oito anos de cortes do Bush.

Estou mais senil a cada dia e esqueci a ordem das coisas, mas acho que depois da governadora surgiu uma mulher no palco pra cantar o hino. Foi, hã, estridente. Não sei se você já prestou atenção no hino americano, que é totalmente bélico. Fala de sangue e bombas explodindo no ar e de como os americanos são corajosos e livres. Uma das estrofes diz literalmente “Conquer we must, when our cause is just” (“devemos conquistar, quando nossa causa for justa”). Ou seja, é praticamente um manual de instruções. Mas americano ouve isso o tempo todo, e quase sempre, no final, desanda a aplaudir e gritar “USA! USA!”. Desta vez intercalado com “Yes we can!”. É, a gente sabe que eles podem.

Aí entraram Obama e Al Gore, juntos. Como Al só declarou apoio a Obama esses dias, foi uma demonstração de prestígio a Michigan trazê-lo ao evento. Al elogiou Hillary (muitas vaias), elogiou o candidato republicano McCain (mais vaias), e comparou Obama com JFK (aplausos mil). Disse que vê Obama despertar nos eleitores o mesmo tipo de esperança e desejo de mudar que viu com JFK.

Em seguida foi a vez de Obama elogiar Al. Lembrou que Al é vencedor do prêmio Nobel da Paz e das eleições de 2000, ao menos através do voto popular. Afirmou que Al poderia ter se aposentado após ter sido vice-presidente, mas permaneceu pra lutar pelo meio ambiente. Obama foi insistente ao elogiar Hillary – disse que ela é uma lutadora, que ela elevou as oportunidades para todas as americanas, que ele é um melhor candidato por ter concorrido às primárias com ela, e que, após quinze meses de disputa interna, o partido democrata está muito mais forte e organizado.

Ele repetiu sua plataforma de governo, que inclui tirar as tropas americanas (“heróicas, fizeram tudo que esperamos delas”) do Iraque, fazer com que os 47 milhões de americanos sem plano de saúde tenham acesso à saúde, e pagar 4 mil dólares por ano aos jovens que queiram cursar faculdade, desde que eles devolvam o “favor” com serviços comunitários. De política externa, só falou da guerra e de como é importante reestabelecer a confiança que o mundo tem nos EUA.

Ele foi puro charme quando, ainda no início, uma manifestante gritou, em alto e bom som, “We love you!”, e ele respondeu: “I love you back” (“amo vocês também”). Obama tem carisma e fala bem. Se os participantes do comício já não fossem todinhos dele, ele os ganharia facilmente.

Terminou e foi cumprimentar os manifestantes mais próximos (que ficaram em pé em frente ao palco, e que só podiam entrar com uma cordinha no pulso. E não sei o que faziam pra receber a tal cordinha. Tinha que ter contribuído financeiramente pra campanha ou o quê? Há um milhão e meio de doadores), sempre cercado por uns cinco guarda-costas. É necessário, eu sei, mas se tá todo mundo num lugar fechado e todo mundo passou por um detector de metais, os riscos não seriam inexistentes?

Na volta pra casa, o ônibus foi de graça. Presente da prefeitura (em grave crise de corrupção) ou do Estado? Não sei, mas o mais bonito do Obama é ver como ele desperta o envolvimento dos jovens, que nunca votaram ou ligaram pra política. Se a cabeça desses jovens for menos egocêntrica que a de gerações passadas de americanos, talvez a eleição do Obama realmente represente uma mudança – change, justamente o seu slogan. Espero que yes, they can.

8 comentários:

  1. Yay! Brigada por ter me contado como foi. De certeza que eu tinha ido com vcs se tivesse aí. Vamos ver o que vai acontecer agora...

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  2. Adorei as notícias!
    Também gosto muito do Obama e do que ele representa para o futuro dos EUA, principalmente para aqueles conservacionistas radicais...
    Vamos ao próximo capítulo!

    Beijos

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  3. Ju, muito obrigada por avisar sobre o comício. Ninguém aqui sabia! Nem o Arthur, que contribui financeiramente pra campanha do Arthur (eu o convidei pra ir mas ele não quis ficar sei lá quantas horas numa fila).
    Ah, e vc perguntou num email porque a Hillary continua aceitando doações, se ela já saiu da disputa. A disputa pode ter acabado, mas as dívidas não se encerram com o fim. Parece que sua campanha ainda tem que pagar uns 30 milhões de dólares...
    (e super obrigada pelo banner. Logo falarei sobre ele num post).


    Chris, tomara que ele ganhe. Acho que ele tem boas chances, mas certamente vai ser uma corrida apertada.

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  4. Lola, muito boa a matéria. Estou publicando no Desabafo País. Vc acha que OBAMA será de fato o novo presidente dos EUA. Um fraterno abraço, Daniel.

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  5. "devemos conquistar, quando nossa causa for justa. Ou seja, é praticamente um manual de instruções(...)" "(...)quase sempre, no final, desandam a aplaudir e gritar “USA! USA!”. Desta vez intercalado com “Yes we can!”. É, a gente sabe que eles podem."
    ___________
    Sabe... Você me deixou com medo nesse trecho.
    Juro por Deus. rs.

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  6. De nada (por ter avisado e pelo banner). Se bem que o banner foi só pra brincar mesmo, porque eu acho que vc devia pegar o mesmo do lost art, que é lindo e tem tudo a ver com o site. Na real eu queria era entender de design pra fazer uma montagem com imagens sobre cinema+política+feminismo+vida e fazer um banner bem legal... quem sabe um dia a gente não chega lá?

    E eu não tinha nem me tocado desse detalhe das dívidas... será que alguém ainda doa, mesmo sabendo que ela não tem mais chance de ser presidente? Não seria uma estratégia melhor doar pro Obama?
    O Marotti doa pra campanha é? Tinha nem idéia. Manda um hi meu pra ele =) Saudade daquela aula... de todas na real.

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  7. Oi, Daniel. Sim, acho que o Obama tem, vejamos, 50% de chances de ganhar. Mas qualquer resultado será apertado. Se um deles ganhar por mais de 10% de diferença, será muito - e inusitado.


    Ollie, é pra ter um pouco de medo sim. É o maior império da história com o maior exército. E com bombas nucleares. E achando que Deus o colocou na Terra pra liderar o mundo. Eu acho bem assustador.

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  8. Ju, vou colocar o banner na próxima seção de perguntas e respostas (a primeira acabei de postar), e falar um pouquinho sobre ele. E sobre o que eu mais ou menos gostaria num banner. Bem mais ou menos mesmo, porque nem tenho certeza.
    Eu gostava do banner do Lost Art, mas se já achava que não tinha muito a ver a presença do meu irmão na foto, imagina agora, no meu próprio blog. Sem falar que isso é criação dele e ele não autorizou o uso (não que eu tenha pedido). Mas quando saí de lá houve alguns conflitos. Ele não queria que eu usasse o nome "escreva lola escreva", disse que era criação dele também (e não é). E também, aquele banner de lá é exclusivamente sobre cinema, e aqui eu escrevo sobre muitas outras coisas.
    Sobre as doações de campanha, imagino que cai um monte quando alguém sai da corrida. A Hillary tem muitos apoiadores, principalmente apoiadorAs, fiéis, que talvez continuem contribuindo um pouquinho. Mas obviamente o dinheiro pra pagar a dívida vai ter que sair do bolso dos Clinton, em sua maioria (mas eles têm dinheiro, né? Cada palestra que fazem custa sei lá quantos dólares).
    É, já faz um tempinho que o Arthur colabora pra campanha do Obama. Vou mandar um abraço seu pra ele, antes d'ele ir pra Londres.

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