Se você já viu o filme, mesmo que só uma vez, deve ter passado pelo que passei num cinema nos EUA. A maior parte dos espectadores chia, alguns vaiam, os mais educados só se entreolham e perguntam: “O quê? Acabou?! Não é possível!”. Ainda não testemunhei ninguém jogar copo de refrigerante na tela, mas deve existir. A revolta é grande. E, no entanto, os críticos americanos babam, consideram “Fracos” o maioral de 2007, e discursam que uma obra não precisa dar todas as respostas e tal. Concordo em parte. Meu problema não é tanto com a falta de respostas, mas com o fato do clímax (no segundo hotel) ocorrer antes da metade. De lá pra frente é ladeira abaixo, e isso é frustrante. Parece que acaba o gás.
Sem sombra de dúvida, até o meio “Fracos” é um grande filme. Começa com um sujeito matando um policial, e em seguida um outro encontra no deserto texano uma transação de drogas que não deu certo. É impressionante o que os irmãos Coen (“Fargo”) fazem com tão pouca trama (tá, tem toda uma crítica aos EUA sobre esse não ser um país para velhos, como diz o título original. A Susan Sarandon de “Telma e Louise” bem que fazia em se recusar a pisar no Texas, esse lugar onde todos parecem ter revólver e chapéu de cowboy). Embora seja só um cara perseguindo outro, a tensão é de matar. Totalmente perfeito. Porém, a partir do momento em que o Josh Brolin desaba após comprar o casaco de um turista e vai parar num hospital mexicano, bom, não é que o filme desabe também, mas que cai muito, isso cai. E não se levanta mais. Além de anticlimático, fica cheio de monólogos demasiadamente longos que param a trama (e torço pra que você veja o filme com legendas, pra decifrar o sotaque texano do Tommy Lee Jones). O livro é igual. A gente já entendeu o tema desde o título, e o xerife segue falando a mesma coisa. É redundante. Os personagens mais fascinantes são despachados, e o livro continua mais 50 páginas só com o xerife dizendo que tá velho demais pra isso. Pô, eu também! Acho que os Coen tomaram a decisão errada ao tentarem ser fiéis, porque deixaram de realizar um clássico. Toda a segunda metade é literária demais e cinematográfica de menos - o contrário da primeira hora.
Daí em diante, quase todos os confrontos que anseamos ver vão acontecer fora da tela. O xerife do Tommy pode ser a consciência da história, mas não deveria ser o personagem principal. Certamente não é ele o ímã do filme, é o Javier Bardem fazendo o psicopata Chigurh. Ou, sei lá, talvez o ímã seja o jogo entre o psicopata e o Josh. Mas nada disso inclui o Tommy. E quando a segunda metade se concentra mais nele, o filme sofre. Ah, aproveito pra te dar uma colher de chá e você ficar com uma dúvida a menos: a ação se passa em 1980. A gente sabe disso porque o Chigurh fala sobre uma moeda de 1958 que tá com ele há 22 anos, e por causa de um túmulo. E atenção, outro serviço lolístico de utilidade pública: aquele equipamento estranho que o Chigurh usa pra matar boa parte de suas vítimas é uma arma pra abater bois. Que bom que eu pude ajudar!
Chigurh. Guarde esse nome cuja pronúncia, ironicamente, lembra “Sugar” (doce, açúcar). O que o Javier faz com esse personagem é “the stuff legends are made of”, sei lá como traduzir isso, o estofo que compõe as lendas? Desde os enquadramentos iniciais já nos sentimos cativados. Esse já entra na galeria dos vilões mais assustadores da história do cinema, sabe, tipo Hannibal Lecter. Sério. O Javier é maravilhoso, como qualquer um que viu “Antes do Anoitecer”, e principalmente “Mar Adentro”, já havia se dado conta. Mas aqui ele faz algo sinistro, com aquele cabelão, um sorriso tímido que vai se abrindo até ocupar o rosto todo, o olhar de peixe morto – não dá pra descrever. Você precisa ver pra crer. Ele é o elemento absolutamente marcante de “Fracos”, e merece o Oscar de coadjuvante que seguramente vai ganhar (a única barbada do ano). Por mim podia concorrer na categoria principal. Seu vilão é tão sobrenaturalmente mau que parece uma versão em carne e osso daquele monstro caricatural de moto de “Arizona Nunca Mais” (também dos Coen), o que atirava em coelhinhos. Por sinal, com tantos cachorros mortos, pássaros ameaçados, e arma pra matar boi, temi pela vida do gatinho que aparece tomando leite no hotel. Aposto como os Coen fizeram isso de propósito.
Um ponto que me faz amar o filme é aquela parte de “E se fosse com você?”. Se eu encontrasse um massacre no meio do deserto e uma mala com dois milhões de dólares (em 1980; deve valer pelo menos cinco vezes mais hoje), ficaria com ela? Mas que diabos eu taria fazendo no Texas? Outro dos meus temas preferidos também tá presente: dá pra fugir sem deixar rastros? Num mundo tão grande, onde se esconder, como sumir? (eu adoro essa parte até em “Dormindo com o Inimigo”).
Mais perto do fim, há uma cena do Javier no quarto de hotel, e a montagem (dos irmãos Coen, que sempre editam seus filmes mas assinam com um pseudônimo) é tão problemática que só pode ser intencional, pra gente não entender bulhufas. Fica um monte de pergunta sem resposta: o Javier tá escondido atrás da porta? Ele tá num outro quarto? Embaixo da cama? Tudo não passa da imaginação do outro personagem em cena? Horrível de confuso. O maridão se desesperou: “Puxa, ninguém entrevistou o Javier pra perguntar onde ele tava?”. Mas isso dá pra relevar. O chato é o cheiro de desperdício que fica no ar.
ATENÇÃO: Se você já leu o livro e viu o filme, leia meus quatro longos posts cheios de spoilers comparando livro e filme e dando todas as respostas. Primeira, segunda, terceira e quarta partes aqui.
Eu achei o filme parado demais. Principalmente na segund ametade, como você mesma relatou. A parte da perseguição atrai a atenção, e eu até achei que faltou humor no filme, tipo Fargo, que faz a gente rir das desgraças que vão ocorrendo. Achei Fargo ainda bem superior a esse. E prefiro Atonement pra melhor filme.
ResponderExcluirOi Lola, puxa, bom saber que você está escrevendo num blog. Assim fica mais fácil acompanhar seus comentários.
ResponderExcluirAgora estou longe de casa não posso lê-los com cuidado, mas de saída concordo a opinião expressa no título. Após o carnaval estendo minhas considerações.
Abraços e boa sorte!
Que bom! Existem dois brasileiros que já conseguiram ver o "No Country"! Comigo são três!
ResponderExcluirQue engraçado você separar o filme em 2 partes Lola, pois comigo aconteceu exatamente o mesmo!
ResponderExcluirAssisti o filme até a metade em uma noite, pois ficou tarde. Estava eletrizante, fiquei louca pra terminar de ver no dia seguinte... porém, tive uma surpresa desagradável.
Achei um filme desperdiçado, como você mesma disse.
Não acho que mereceu o Oscar, mas poderia merecer se tivesse sido feito diferente depois da metade.
Bjo.
Uma obra prima daquelas que ficaram pra historia do cinema ,onde os fracos nao tem vez ja e um classico e mereceu todos os premios , ao contrario de fargo que foi superestimado ,um filme que nao empolga em momento nenhum ,muito dialogo e pouca acao
ResponderExcluirBom texto. Pessoalmente, penso que os irmãos Coen conseguiram uma adaptação muito fiel, mas com este filme, há um paradoxo na sua construção na relação entre forma e substância que faz com que parece uma fita aparente muito simples para o seu enredo, que parece que não diz nada e até mesmo a sua história é um pouco confuso, mas não por isso se torna uma obra-prima que gere a linguagem cinematográfica com perfeição. Além do elenco é de luxo, Tommy Lee Jones, Javier Bardem e Kelly Macdonald, que era digno de prêmio SAG por sua grande desepemeño neste filme.
ResponderExcluirOnde esse filme é confuso? É absolutamente claro! E é sensacional, um dos melhores dos Irmãos Cohen. Já assisti várias vezes, inclusive hoje, no Telecine Cult.
ResponderExcluirCaralho, não entendi nada, n sei se é sono mais o final então que me fudeu de vez
ResponderExcluirCaralho, não entendi nada, n sei se é sono mais o final então que me fudeu de vez
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