domingo, 30 de novembro de 2003

CRÍTICA: MAR ABERTO / Nós jogamos com os tubarões

Fiquei com vontade de ver “Mar Aberto” desde que vi o trailer, que, ao contrário do trailer de “Alexandre” e de “Rei Arthur”, que vi 352 vezes cada um, o do “Marzão” só passou uma. A história é simplérrima e isso explica por que os críticos não conseguem escrever mais que dois parágrafos sobre o filme: um casal vai mergulhar nas férias, é esquecido pelo barco em pleno mar, e fica lá no meio daquela imensidão azul, esperando Godot ou qualquer outra coisa que não vem. A aventura é curtinha, menos de uma hora e meia, e o que aparece por boa parte do tempo são as duas cabecinhas boiando. E muitos tubarões.

Como o filminho é americano, mas independente – custou a bagatela de130 mil dólares num país em que uma produção média não sai por menos de 30 milhões –, os tubarões são de verdade, não umas geringonças construídas de latão ou uns rabiscos gerados em computador. O mar é de verdade, não um tanque planejado. Os atores são ilustres desconhecidos e, assim, o diretor sente-se à vontade pra fazer o que quiser com eles (incluindo uma breve e gratuita cena de nudez com a Blanchard Ryan). Bom, no fundo não acontece muita coisa no filme, mas parece tudo muito real. E é uma tensão apavorante. Poucas vezes vi o maridão tão assustado no cinema. Minha mão virou pastel.

Este é um caso em que os críticos até que gostam do filme, mas o público, não. Na sessão que eu fui, um rapaz gritou pro outro no fim, “Não disse que a gente devia ter ido ver ‘Rei Arthur’?”. Li coisas bem injustas acerca de “Mar”. Que a única preocupação do casal é urinar ou não na roupa de mergulho. Que eles são insuportáveis. Que a gente não se identifica com eles. Que a gente torce pelos tubarões. Que o maior prazer da obra é ver yuppies virarem comida de peixe. Olha, não achei nada disso. Não tenho certeza se me identifiquei com a situação, baseada em fatos reais, porque mergulhar, eu? Não sei nem afundar. Mas achei a crise conjugal do casal bem crível. Chega uma hora na tradicional troca de um culpar o outro em que a moça fala “Eu queria esquiar!”. Com todo o respeito ao respeitável público, acho que o pessoal tá mal-acostumado. Depois da lavagem cerebral hollywoodiana, a gente espera sangue, orçamentos gigantescos, efeitos especiais. Esta certamente não é uma história de incrível superação humana, como a fábrica de sonhos faria. E talvez por isso seja tão eficaz.

Se “Mar” traz alguma mensagem, é: quando você estiver num barco, socialize com a tripulação. E talvez uma mensagem subliminar: mergulhar é um belo programa de índio. E a última: caiu na rede é peixe. Legal mesmo foi sair da sessão e notar que o shopping tinha montado uma exposição de tubarões vivos. Se fossem mortos fariam mais sucesso, depois desse filme. Travei o seguinte diálogo com o maridão na saída: Eu: “Pensei que xixi atraísse tubarão”. Ele: “Qualquer coisa atrai tubarão”. Eu: “Você tá de marcação com os tubarões”. Ele: “Quero que eles morram”. Ele realmente ficou revoltado com os pobres peixões. Eu não. Eu gosto deles. Tanto que, em sua homenagem, vou contar a única piadinha que sei. É assim: você gosta de fofoca? E de tutubarão?

Um comentário:

  1. Olha, eu gostei desse filme. Bem triste... mas o segundo Mar tem um final bem ridículo, já assistiu?

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