Hoje, dia 28 de setembro, é uma data importante, de muita garra: é o dia de luta pela descriminalização do aborto na América e Caribe. Esta foi uma data criada há 31 anos para enfrentar o problema da clandestinidade do aborto, que mata milhões de mulheres todos os anos.
Mas começando com uma boa notícia: no início de setembro, em decisão unânime, a Suprema Corte do México descriminalizou o aborto. Dez juízes, ao examinarem a constitucionalidade de leis específicas, decidiram que o aborto não pode mais ser considerado crime no país. Em outras palavras, não é mais possível processar uma mulher por abortar. As penas variavam de um a três anos de prisão.
Três dos 31 estados mexicanos já permitem o aborto (Oaxaca, Veracruz e Hidalgo), além da capital, a Cidade do México. Nos outros estados, as proibições são parecidas com as do Brasil: o aborto é direito em casos de gravidez resultante de estupro e risco de vida para a gestante. A descriminalização é um avanço fundamental.
Atualmente, apenas quatro países na América Latina autorizam o aborto em qualquer circunstância: Cuba, Argentina, Uruguai e Guiana. Ao contrário dos países ricos, que na sua maior parte permitem o direito das mulheres ao aborto há várias décadas, o nosso continente é um dos mais restritivos. Grupos ultraconservadores dos países ricos, que já perderam a batalha para controlar o corpo das mulheres por lá, investem pesado aqui para proibir o aborto em todos os casos.
Um exemplo desse absurdo foi reportado na semana passada pela Agência Pública. Uma menina negra e pobre de 14 anos de Minas Gerais engravidou depois de um estupro do ex-namorado, de 21. Se a equipe médica tivesse seguido o protocolo para vítimas de estupro, teria dado a pílula do dia seguinte a ela, e ela não teria engravidado. Mas os médicos não acreditaram nela.
Ainda assim, ela registrou um boletim de ocorrência. Dois meses depois, descobriu que estava grávida. Nem ela nem a mãe, que é empregada doméstica, sabiam que é um direito realizar um aborto legal, seguro e gratuito em caso de estupro. Apenas 42 hospitais num país de dimensões continentais como o Brasil fazem o aborto legal, que é de baixa complexidade.
Através de uma advogada, a menina pediu para realizar o aborto. Como a cidade é pequena, de 30 mil habitantes, em pouco tempo todos sabiam da gravidez, e assistentes sociais foram pressioná-la na casa dela para não interromper a gestação. A sentença só veio com quase 12 semanas de gravidez: a juíza Indirana Cabral Alves negou o aborto. Ela fundamentou a sentença baseando-se no direito à vida do nascituro, citando o Pacto de San José da Costa Rica, sempre usado por juristas cristãos, embora em 2012 a Corte da Convenção Americana de Direitos Humanos -- que é o órgão oficial do tratado --, decidiu que o embrião não pode ser interpretado como uma pessoa. Usando o tal pacto como escudo, mesmo em casos de aborto legal (que os conservadores querem proibir de qualquer jeito), proíbe-se que crianças e adolescentes possam abortar.
Isso tudo aconteceu em setembro do ano passado, só três semanas depois que fanáticos se reuniram em frente a um hospital em Recife para tentar impedir que uma menina de 10 anos do Espírito Santo abortasse (e até hoje ninguém foi punido por divulgar o nome e endereço de uma menina de 10 anos ou onde ela estava internada).
Felizmente, neste caso de Minas, um promotor público falou com uma colega de Belo Horizonte, que disse que a adolescente poderia ir lá e que seria atendida. Ela e a mãe tiveram que viajar escondidas. Depois de muito medo de serem descobertas, a menina conseguiu realizar o aborto, sem complicações.
Mas claro que não acabou. Indirana, a juíza terrivelmente católica que havia negado à adolescente o direito ao aborto legal, compartilhou a sentença num grupo de WhatsApp que reúne outros juízes mineiros. À imprensa, a juíza diz que pode responder perguntas, já que o Código de Ética da Magistratura não a deixa comentar processos em que atuou. Mas a um grupo de Whatsapp, a sentença está à disposição.
A situação, que já está difícil há anos, tende a piorar. Há vários projetos legislativos no Congresso tentando barrar cada vez mais o aborto legal. Nos municípios, vereadores e prefeitos retrógrados conseguem passar aberrações como "Semana de Defesa da Vida", para fazer campanha não só contra o aborto, mas também contra direitos reprodutivos em geral. É o que foi aprovado em Fortaleza recentemente pelo prefeito Sarto Nogueira (PDT), um ginecologista evangélico.
A lavagem cerebral feita contra a legalização do aborto desde no mínimo 2010 (o segundo turno das eleições entre Serra e Dilma foi todo dedicado ao tema) tem dado certo. Porém, como mostrou uma matéria da semana passada da BBC News Brasil, numa pesquisa realizada em 27 países, esse apoio à restrição ao aborto tem diminuído. Somando a porcentagem dos brasileiros que responderam "o aborto deve ser permitido sempre que uma mulher assim o desejar" e "o aborto deve ser permitido em determinadas circunstâncias, por exemplo, no caso de uma mulher ter sido estuprada), os números chegaram a 64%. Em 2014, a porcentagem dera de 53%. Ou seja, sempre que você ouvir que "a população brasileira é contra o aborto", pergunte: em quais casos?
É muito provável que, com a frustração do golpe que não houve no dia 7 de setembro (um recuo com carta escrita pelo ex-presidente golpista Temer, o que desagradou muitos apoiadores do genocida), o pior governo de todos os tempos tente manter sua base mobilizada através da pauta de costumes.
Desta forma, eles tentarão o máximo que podem avançar na proibição do aborto. Cada vez mais, o Brasil anda na contramão do mundo.
Mais um motivo para continuarmos resistindo.
É disso que os homens tem mais ódio em relação às mulheres: eles podem construir impérios através da violência, do dinheiro ou do poder, mas se uma mera mulher (na visão misógina deles) tivesse dito "Eu não quero manter essa gravidez", eles nem mesmo existiriam. Todo o dinheiro poder e violência é inútil diante da simples negativa de uma mulher em prosseguir com a gestação. Eles podem dominar o mundo, mas a decisão mais importante de toda a vida deles - se eles irão existir ou não - depende totalmente de uma mulher dizer que aceita manter uma gestação. Eles são totalmente descartáveis se a mulher quiser e sabem disso.
ResponderExcluirO controle do útero visa interesses escusos dos milionários, quando se trata de explorar trabalho doméstico não remunerado e manter o exército de miseráveis nascendo pra moer na máquina do capitalismo. Mas o ódio misógino à mulher e ao aborto vem daí: o homem sabe que, no fundo, não tem poder nenhum nem sobre sua própria existência. Se uma mulher disser não, o embrião nem vai chegar a virar gente. Se uma mulher disser não, eles simplesmente não existirão. Esse é o poder que eles nunca terão e por isso tanto ódio pela mulher que diz "Não" à gravidez.
Mas mulher também não tem poder nenhum sobre nada, se a mulher nasce com um útero, o mérito é da natureza, não dela, segundo que a mulher não tem a capacidade de fazer um aborto seguro de forma natural, isso é só possível utilizando a estrutura e equipamentos desenvolvidos com a participação dos homens, se vc tivesse no meio da selva por exemplo, sem poder usufruir das comodidades da civilização de aço e concreto patriarcal, e tivesse que depender apenas da capacidade do seu gênero, você nunca seria capaz de realizar esse procedimento sem arriscar a própria vida, então não se iluda pela narrativa feminista, sua vida seria bem diferente sem a influência masculina, pro bem e pro mal, pq ao contrário das mulheres, homens não são as criaturas mais perfeitas do universo, e nem tentam vender essa imagem, pq são conscientes das próprias limitações.
ExcluirPutzzzz...Será que ele quer que alguém valide esse comentário absurdo? É típico de INCEL...🤮🤮🤮
ExcluirVocê escreve um post sobre a descriminalização do aborto na América Latina. Ó o comentário do incel. Resolvi publicar porque é uma pérola. Pra rir muito.
ResponderExcluirHá um quinto país americano e que faz fronteira com o Brasil, onde o aborto também é legalizado: a França.E parece que no Chile na nova constituição que está sendo elaborada, os constituintes aprovaram a descriminalizacao.
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