Reproduzo aqui hoje o artigo que o candidato a presidente Guilherme Boulos (Psol) publicou na Carta Capital esta semana. Boulos traduz como poucos o que se passa na política brasileira atualmente.
Bolsonaro vende o Brasil para o Centrão para se livrar do impeachment e salvar seus filhos da cadeia. Eleito com a promessa de “mudar tudo o que está aí” e acabar com a corrupção, nem faz questão de esconder isso. O ministro Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo, declarou serenamente há alguns dias: “Temos um quadro de quem vota e de quem não vota conosco. A negociação é com os partidos. O senador Ciro Nogueira, presidente do PP, tem 70 votos. Por isso, ele tem espaço no governo com o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. Ele assumiu o compromisso de ser governo. Exijo um nível de fidelidade de 80%”. Até cláusula de desempenho o Centrão ganhou agora.
Exemplo caricato dos (nem tão) novos amigos de Jair Bolsonaro é Roberto Jefferson, um dos camaleões mais desavergonhados da história da política brasileira. Nos anos 1990, era líder da tropa de choque de Collor. Depois, foi acusado de participar do esquema de compra de votos da reeleição de FHC. Anos mais tarde, estava no centro do chamado “mensalão” e admitiu que vendia votos por dinheiro e cargos. Teve o mandato cassado, foi condenado pelo Supremo e preso. Agora, virou bolsonarista de carteirinha. Posa em foto com fuzil na mão, ameaça o País com golpe militar e diz que está na linha de frente do governo.
O PTB de Jefferson é do Centrão, que se aliou com Bolsonaro nos últimos meses. Na prática, considerando o desgaste do governo com setores da ativa das Forças Armadas e sua perda de apoio social, é razoável supor que esse bloco fisiológico se tornou o maior fiador da governabilidade. Sem o apoio desses partidos, provavelmente o processo de impeachment já estaria em curso na Câmara.
Mas quem são eles? O termo Centrão é antigo e nem sempre significou a mesma coisa. Começou a ser utilizado durante a Assembleia Constituinte de 1988, como um grupo de apoio a José Sarney. Eles se definiam como um campo suprapartidário e “conservador”. Representavam interesses da elite econômica, preocupada em barrar “direitos demais” na democracia nascente. Ou seja, eram deputados que fizeram um bloco para conter o avanço de reformas populares na formação da Nova República.
O formato atual do Centrão foi desenhado pelo gângster Eduardo Cunha. Ele criou um sistema para eleger deputados com financiamento ilegal e montou uma bancada particular. Acumulou poder. Em 2014, comandava 220 deputados e 13 partidos, quase metade da Câmara. Obviamente, não foi ele quem inventou o toma lá dá cá na relação entre o Executivo e o Legislativo, mas o elevou à categoria da chantagem explícita.
Além disso, se ainda existia algum elemento de contrapeso institucional do antigo “centro democrático” de Ulisses Guimarães, ele desapareceu inteiramente. Cunha não hesitou em provocar implosões institucionais em nome do interesse próprio e de seu bloco.
Neste sentido, preparou terreno para que o Centrão pudesse ser base de um governo que prega fechamento do Congresso e ruptura democrática. Bolsonaro, pela primeira vez na defensiva, tampouco se fez de rogado em abandonar o figurino de “antissistema” para cair nos braços do modelo de governabilidade daquilo que ele chamava de “velha política”.
Assim, entregou o FNDE ao PP, com orçamento de 54 bilhões de reais. Um prato cheio para desvios… No ano passado, o Fundo anunciou que realizaria um leilão para compra de “equipamentos de tecnologia educacional para a rede pública de ensino”. Queriam comprar 1,3 milhão de computadores, num total de 3 bilhões de reais. Curiosamente, só uma escola da minúscula cidade mineira de Itabirito receberia 30 mil laptops, algo como 118 notebooks para cada aluno. No total, 355 escolas receberiam mais de um laptop por aluno.
É só um exemplo. Tem também a Funasa, vários departamentos de segundo escalão e autarquias regionais. Sem contar a recriação do Ministério da Comunicação, entregue ao genro de Sílvio Santos, também deputado do Centrão. No total, um levantamento feito pelo site Poder 360 mostrou que o governo Bolsonaro liberou cargos que chegam a 68 bilhões de reais em orçamento para investir em 2020.
Em troca disso tudo, Bolsonaro calcula os votos. Precisa garantir que 171 deputados apoiem seu governo genocida e evitem a abertura de um processo de impeachment. O Centrão, convenhamos, estará com ele enquanto for conveniente. Já mostrou no impeachment de Dilma Rousseff que fidelidade não é o seu forte.
No ritmo em que o governo tem perdido aprovação e colecionado escândalos -– sobretudo se Queiroz resolver falar o que sabe -– talvez esse casamento de conveniência não complete aniversário. Até então o Brasil segue governado por uma aliança única e grotesca entre terraplanistas, milicianos e mercenários.
O que o Queiroz sabe?
ResponderExcluirOu é só uma torcida essa pergunta?
Nunca foi pra mudar "tudo isso que está aí". Foi só pra ferrar com os pobres mesmo.
ResponderExcluirPaulinho da Força lidera a máfia das licitações em São Paulo, o tal centrão está cheio.
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