Há outras convenções importantes. Musicais em geral são “feel good movies”, filmes pra cima, que nos fazem sair cantarolando do cinema. Mesmo quando falam de temas hediondos, como guerras, terminam com alguma pontinha de esperança. Em “Hair” o personagem mais carismático morre, e a última cena é de um cemitério, mas os outros hippies se reúnem, juntos, e cantam “Deixe a luz do sol entrar”. “Cabaret” talvez tenha o fim mais pessimista de todos, com a Liza Minelli cantando que a vida é um cabaré, o que não é exatamente uma canção alegre, e em seguida vemos o recinto sutilmente tomado por nazistas. Esses são exemplos de musicais tristes, que são minoria. Já “Hairspray” trata de preconceitos, mas também da força da música para derrubá-los. E mesmo “A Pequena Loja dos Horrores”, que lida com plantas alienígenas que comem humanos e dentistas sádicos (existe outro tipo?), está cheio de humor. Bom, “Sweeney” não tem nada disso. É um filme sem nenhuma esperança ou fé na humanidade. É o mais cruel do Tim Burton (repleto de paralelos com “Edward Mãos-de-Tesoura”), e seu melhor resultado desde “O Estranho Mundo de Jack”, que, pensando bem, também é um musical. E só o Tim pra acabar um filme daquele jeito (não vou falar como). Qualquer outro diretor, tirando talvez o Polanski, incluiria alguma cena redentora.
Começa com sangue nos créditos e segue com um jovem chegando de navio à Londres do final do século 19, e já cantando uma canção de louvor ao que vê. Sweeney (Johnny Depp) o corrige rapidamente, diz que ele ainda vai aprender, e define a cidade como um poço sem fundo infestado por vermes. O filme não deixa dúvidas sobre quem tem razão. Nunca Londres foi pintada de um jeito tão horrível. Nem em “Do Inferno”, também com o Johnny, que mostrava prostitutas dormindo amarradas em bancos de igreja. Pra você ter uma idéia do clima sinistro de “Sweeney”, uma das personagens declara: “Não tenho sonhos, só pesadelos”. E ela é das mais otimistas!
O musical é tão escuro que praticamente lembra um filme em preto e branco. Todas as pessoas são pálidas, as ruas sombrias, com ratos e esgoto a céu aberto. Apenas os flashbacks são felizes. Primeiro eu pensei que só o passado do Sweeney fosse colorido, com ele, sua mulher e filhinha andando numa Londres cheia de flores. Mas o corte pro que acontece de terrível com a esposa no baile de máscaras também tem cores vibrantes. A fantasia da Helena Bonham-Carter na praia tem cores; e há o cabelo loiro da menina. Mas, de resto, é tudo fúnebre. O sangue abundante que respinga na câmera atrapalha o preto e branco, só que parece vermelho demais pra ser real. Os ângulos de câmera e a brilhante fotografia evitam o tom claustrofóbico. Imagino que boa parte do musical da Broadway (de 1979, do Stephen Sondheim) se passe dentro da barbearia e da loja de tortas.
Novamente, como em “Chicago”, um elenco de não-cantores se sai muito bem. Todos estão perfeitos. Em sua sexta colaboração com o Tim, Johnny, mesmo com parte do cabelão branco, a cara branca, olheiras e nenhum sorriso, nunca esteve tão sexy. A Helena, mulher do diretor, tem uma energia que segura o ritmo. Ela é a alma. Eu adoro o Alan Rickman, e ele poderia ter tido mais oportunidades. E tem o Sacha Cohen, o Borat, que surge em duas cenas (e uma delas meio que não combina com o clima), mas ainda assim está marcante. Todos seguram melodias difíceis. Eu nem sabia que “Pretty Women” pertencia a este musical. Lembra dela na voz da Barbra Streisand?
Depois de “Titus” e “Sweeney”, acho que você deve fazer como eu e evitar tortas de carne por um tempo - digamos assim, pelos próximos 50 anos. Mas não evite “Sweeney” de jeito nenhum. E pode me chamar de canibal, mas, se eu precisasse escolher entre tortas com recheio de carne humana e tortas com recheio de baratas, ahn, nem preciso continuar esta frase.
P.S.: Eu gosto de “Chicago”, se bem que “Sweeney” é mais inesquecível. Não dá pra compará-lo a musicais mais recentes, do tipo “Dreamgirls” (que é um subgênero dos musicais, o dos bio-pics).
P.S.2: É ótimo que 2007 tenha sido tão pródigo em matéria de musicais. Fora “Sweeney”, houve “Hairspray”, “Across the Universe”, e o independente “Once”. Todos filmes muito acima da média.
Eu realmente não tinha entendido q era um musical pelo trailer!
ResponderExcluirEu acho que o Burton e o Depp formam uma das melhores duplas do cinema. Parece que o Depp consegue encarnar praticamente todos os personagens que o Burton faz pra ele. Não que ele não seja um excelente ator por si só, mas algo acontece qdo os dois se juntam. Vc concorda? Tô super idealizando? heheheheh
Ai, me matei de rir qdo vc disse "as pessoas cantam em vários momentos ao invés de falar e a orquestra toca do nada. O que é tão realista quanto, vejamos, aqueles filmes de ação em que o herói derruba três helicópteros com um tiro, e nenhum cai em cima dele." aaaahahhaha
Beijossss!!!
Voce sabia que ha um original em versao cinematografica? Ate pouco tempo estava passando no On Demand... nao sei se (como o Hairspray original) eh um filme "normal" em vez de musical. Vou dar uma olhada... :)
ResponderExcluirEu soube dessa versão original do "Hairspray"! Li uma matéria muito bacana em http://www.woofmagazine.net/, edição #3. O nome do texto é "Quero ser Elizabeth Taylor". Muito bacana! Me encheu de curiosidade! vale a pena ler.
ResponderExcluirÉ, Mel, Burton e Depp formam uma grande dupla, o que não quer dizer que tudo que eles façam dê certo. Não gosto de "A Lenda do Cavaleiro sem Cabeça" nem morro de amores por "A Fantástica Fábrica de Chocolate". Mas qualquer dupla que faz "Edward Scissorhands" e "Sweeeney Todd" não precisa fazer mais nada! Ah, sobre os filmes de ação... Pô, não é verdade? O pessoal que não gosta de musical diz que eles são totalmente fora da realidade, mas e os filmes de ação que vemos são o quê?!
ResponderExcluirAndie querida, vc por aqui?! Que bom! É, eu vi no catálogo da Netflix mais de uma versão de "Sweeney Todd" gravada da Broadway. Já encomendei. E aí, já viu "27 Dresses"? Arrasta o James pro cinema!
ResponderExcluirLah, consegui chegar à revista, mas não ao artigo.
Lola, ja viu Big Fish, do Burton. Sem o Depp dessa vez. Eu acho esse filme muito bom. O melhor dele!
ResponderExcluirObs: Eu ja tinha postado esse comentário em algum lugar mas não achei ele, hsuhsauhs...
Lola, concordo com o que você disse sobre musicais em geral serem filmes "feel good". Da última vez em que vi Hair, deixei meu cabelo crescer até a cintura. Tô falando sério.
ResponderExcluirPuxa, Luciano, acredita que não vi Big Fish? Vou acrescentar a minha lista de must-see's!
ResponderExcluirQue coisa, Helen! Eu adoro Hair, mas não sei se algum filme já me fez mexer no cabelo!
Lola, não acredito! Assista urgente e depois me conta o que vc achou...
ResponderExcluirOk, Luciano. Seu desejo é uma ordem pra mim.
ResponderExcluirAh, eu adorei!
ResponderExcluirParece que só eu... não, é que todo mundo no cinema tava com uma cara de "É só isso??"
Superou minhas expectativas.
E o final... sem comentários!
Com um ano de atraso: assisti a "Sweeney Todd" antes de ontem apenas. Muito bom mesmo o filme - e todos os outros musicais citados. "Once" em particular tem um lugar guardado aqui pra mim. Achei genial o filme.
ResponderExcluirO Tim Burton é muito louco - hahaha -, mas produz filmes muito bons. A mulher dele me dá medo (por ter feito a Bellatrix de Harry Potter), mas estava ótima nesse filme. Aliás, medo ou não, ela é uma atriz do caramba.
Quanto ao Johnny, sem comentários.
Adorei o final do filme, aliás: se tivesse acabado de outra maneira, acho que não teria sido tão bom.
pow alguem me diz aí o final do filme.na net eu só assisti um pedaço.to querendo comprar o filme mas tenho medo de nao gostar do final.ate a parte que eu vi o filme foi ótimo por favor me digam^^
ResponderExcluirse você curte musicais dê uma olhada em Repo! The Genetic Opera com a Sarah Brightman e Paris Hilton
ResponderExcluirqnt ao Sweeney
filme maravilhoso, principalmente pelo Alan Rickman
Sweeney Todd é sim maravilhoso! Você já disse tudo, então não tenho muito o que falar, o que achei mais legal é o fato de que o Johnny (meu ator favorito e uma das pessoas de que mais sou tiete e admiro), foi um tanto desafinado em algumas canções, mas mesmo assim ficou o máximo, porque sua voz deu o tom do personagem e ficou perfeito! A helena é maravilhosa, também sou muito fã. É legal comentar a ironia e humor negro presentes no filme, que, na minha opnião, em vez de atrapalhar, se equilibram com o clima sinistro. Exemplo: A cena do "Pirelli's Miracle Elixir" e a fantasia da Mrs Lovett, "By the Sea". Eu como fã do Johnny e do Tim, passei dois anos aguardando e acompanhando o making do filme e quando assisti não me decepcionei nem um pouco 9e cantei muito no cinema, hehe)
ResponderExcluirO ano foi maravilhoso pra musicais mesmo, também amei Hairspray, o que não gostar nessa história? Levanda bandeiras maravilhosas de forma divertidíssima, com um elenco pra ninguém botar defeito. Amei a adaptação e fiquei com muita vontade de ver a peça no teatro. Across the Universe é mágico, chorei três vezes durante o filme, como fã de Beatles não dá pra não se emocionar, interpretações maravilhosas das músicas, sobretudo de Let it Be (chorei e fiquei arrepiada)e de "While My Guitar Gently Wheeps".
E super concordo com você em relação aos filmes de ação! huahauah Pura ficção por pura ficção, eu prefiro mil vezes a magia (sinistra ou não) dos musicais!
MAS MEU DEUS!
ResponderExcluirEssa sou eu, fã ASSÍDUA do blog da Lola e também FANÁTICA por Sweeney Todd desde os meus quinze aninhos (e tenho uma tatuagem grade das navalhas dele nas costas pra lembrar disso), mas nunca tinha lido essa crítica!
Sou fã da obra original da Broadway e do filme do Tim (não gosto da outra adaptação para o cinema).
Quase chorei. Minha ídola idolando meu filme ídolo. Explosão de idolatria. Lolinha, me adota?