Tenho a vaga impressão que vi um filme 24 horas atrás. Não posso jurar, mas acho que era “Be Cool – O Outro Nome do Jogo”. Também acho que vi o original. Neste caso, a amnésia se justifica, porque a comédia é de 95. Claro que, se o troço fosse marcante, ele ficaria na memória. E aí haveria até alguma razão pra se produzir uma seqüência. Ou seja, este “Be Cool” entra no rol das continuações inúteis, na companhia de outros desastres como “Miss Simpatia 2” e “O Chamado 2”. Inclusive, o filme já começa com um diálogo entre o John Travolta e o James Woods sobre como seqüências só são feitas pra extorquir dinheiro do público. E nós, o respeitável público em questão, até damos uma risadinha amarela pra mostrar que entendemos a piada. Mal sabemos que as risadinhas amarelas darão o tom pelas próximas duas horas. Em compensação, tenho certeza absoluta que anteontem vi em DVD o último Almodóvar, “A Má Educação”. Aí fiquei pensando: por que, oh Deus, por que qualquer bobagem meia-boca ganha as salas daqui, enquanto a gente tem que ver as obras de um dos maiores diretores da atualidade na telinha?
Adorei “Má Educação”, mas vou forçar os miolos pra relembrar “Be Cool”. A historinha é assim: o Travolta, que parece que em “Get Shorty” trabalhava com a sétima arte, agora está metido na indústria fonográfica. Ele se associa a Uma Thurman, viúva de um amigo dele, pra promover uma cantora aí. Muita gente tenta matá-lo, mas ele é extra-cool e se safa de todas. É, acho que é isso. Bom, esta comédia fraca de dar dó tá sendo vendida como a volta triunfal de John e Uma juntinhos. Então vamos falar dos dois. John recebeu 20 milhões da ex-moeda forte pra estrelar isso daqui; Uma, 12. Fico feliz que alguém esteja lucrando com a desgraça alheia. O John parece congelado, tadinho. Já tá mais que na hora de começar a campanha “Tarantino, Salve a Carreira do Travolta – De Novo!”. A Uma faz o papel de uma loira. Não dá pra falar mais sobre o personagem dela, que consiste em fazer a mesma careta ao olhar pra alguma nova diva da música pop com grande admiração. Mas sim, Uma e John repetem a dose de “Pulp Fiction” e dançam. Mas não basta juntar uma das muitas coisas que deram certo em “Pulp” pra se fazer outra. Não é assim que a equação funciona. Além do mais, quem coreografou essa seqüência não entendeu “Pulp”, em que a Uma era a mulher de um gângster, e o John dançava por obrigação, ambos dopadíssimos. Sem falar que, em “Be Cool”, nem um ótimo dançarino como o John consegue rebolar ao som de “Insensatez”, versão rap (não tô inventando). A cena é péssima, e essa é a razão de ser do filme.
Outros detalhes que me chamaram a atenção, tanto que permaneceram na minha memória residual: como o pai da Liv Tyler é feio! Ele parece uma versão borrada do Mick Jagger. E como que alguém como o Elmore Leonard escreve algo tão ruim? Não é o mesmo por trás de “Jackie Brown” e “Irresistível Paixão”? Eu pensei que ele fosse cool. E a gag do Vince Vaughn como branco que fala como negro funciona por uns dez segundos. Por exemplo, funcionou no trailer. Mas, pra não dizer que nada se salva, o astro de luta livre The Rock tem momentos fofinhos como um guarda-costas gay. Só não dá pra partir daí e afirmar que The Rock é audaz em satirizar sua figura. Audaz é o Gael García Bernal em “Má Educação”! Um ator americano jamais aceitaria um papel desses. Fica a sugestão: corra pra longe de “Be Cool”, e corra pra locadora pra ver mais um grande Almodóvar.
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