quarta-feira, 27 de novembro de 2002

CRÍTICA: POR UM SENTIDO NA VIDA / Faz sentido

Lembra que semana passada eu tava reclamando da falta de filme pra adulto? Bom, estreou um. Chama-se "Por um Sentido na Vida". Lógico, ser adulto e ter custado uma ninharia não são sinônimos de algo memorável. Mas "Sentido" é melhorzinho que as asneiras que passam aqui.

A maior estrela de "Sentido" é a Jennifer Aniston. Quem?! A Rachel de "Friends", gente. Se você, como eu, não vê "Friends", dançou – fica sem entender quem é a Jennifer. Ela tem outras cartadas no currículo. A principal é ser a esposa do Brad Pitt. Ou eles já se separaram? Posso estar defasada; afinal, eles estão juntos faz mais de um ano, e a união das celebridades não costuma durar tanto. Aí você, leitora amiga, pode perguntar: ué, por que alguém casada com o Brad precisa descobrir um sentido na vida? É que o título original é "The Good Girl", que a gente automaticamente traduz por "A Felizarda", mas que na realidade significa "A Boa Garota".

Pra explicar o título, preciso contar um pouco da história, então com licença. A Jennifer trabalha como caixa de um supermercado em Wasteland, Texas. Ela odeia sua existência, já que não é casada com o Brad, e sim com o John C. Reilly, e a comparação é deprimente. Quero dizer, o John é excelente ator e talvez você já o tenha visto em "Boogie Nights", mas digamos que ele nunca entrará na galeria dos Colírios da "Capricho". Toda santa noite, ao voltar do trampo, a Jennifer encontra o John sentado no sofá, assistindo TV e fumando maconha com seu melhor amigo. Ela logo se envolve com um carinha sete anos mais novo – um colega que se apelida "Holden" em homenagem ao protagonista de "O Apanhador no Campo de Centeio". Pronto, se tem referência literária explícita no meio, já dá pra sacar que não é o típico produto hollywoodiano, né?

Jennifer, no filme, não é uma boa garota. Ela trai o marido e se recusa a participar de um grupo de estudo da bíblia. Está crente que irá pro inferno. Sem dúvida, morar no Texas deve ser o inferno. Quase todas as pessoas da trama estão fugindo de alguma coisa. Sabe o que acontece com as duas únicas personagens relativamente felizes? Uma morre, a outra é espancada. Isso dá uma boa idéia do que o diretor Miguel Arteta e o roteirista Mike White (que faz um guarda fanático) pensam de quem não leva vidas de desespero silencioso.

Pessoalmente, concordo que, na falta de um Brad Pitt, toda mulher de 30 deve ter direito a um amante de 22. Agora, o interessante de "Sentido" é que tem uma carrada de crítico classificando esse drama bastante pesado de comédia. Vai nessa, vai. Vá pensando em se divertir com a estrela de "Friends" e você vai sair xingando o bilheteiro. "Sentido" é esquisitão, bem na linha do cinema independente. Aliás, ele mantém a tradição inabalável dos indies ao mostrar uma dona chamando o Hugo. Todo filme que concorre em Sundance tem cena de vômito.

A Jennifer está ótima, assim como o resto do elenco. De cara, ela parece pedir ao público: "esqueçam que eu ganho um milhão de dólares por cada episódio de sitcom. Sou gente como a gente". Sei, e eu sou a Gisele Bundchen, sem os casacos de pele, claro. Mas a Jennifer deve ser indicada ao Oscar de Melhor Atriz sem Maquiagem. Quase sempre tem alguma estrela que leva o prêmio por interpretar mulheres consideradas pobres pelos padrões americanos e classe média-alta, pelos brasileiros. Helen Hunt ganhou em "Melhor é Impossível", Halle Berry em "A Última Ceia". Quem sabe a Jennifer não encontra um novo sentido na vida na forma de uma estatueta dourada?

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