terça-feira, 28 de agosto de 2018

SÉRIE SOBRE A CAÇA AO UNABOMBER DEIXA DE LADO AS MULHERES

Em poucos dias eu vi os oito episódios de uma série que foi lançada ano passado, Manhunt: Unambomber.
Como cheguei a essa série? É que vi que, entre os indicados do Emmy, estava Law and Order True Crime, que falava dos irmãos Menendez, dois americanos que em 1989 mataram o pai e a mãe. O crime foi tão popular lá quanto o assassinato dos Richthofen foi aqui. O julgamento foi televisado e todo mundo ficou sabendo que aquela imagem de família rica e tradicional envolvia pedofilia e estupro. A série, que foca na advogada de defesa dos irmãos, claramente adota esse ponto de vista (outras pessoas acreditam que os irmãos Menendez mataram os pais pra ficar com a fortuna). 
De um jeito ou de outro, os irmãos foram condenados à prisão perpétua (escaparam da pena de morte). E mesmo que a série (também de oito episódios) esteja longe da excelência de The People v. O. J. Simpson: American Crime Story (ou de O Assassinato de Gianni Versace), ainda assim é interessante.
Então sem querer fiquei sabendo dessa outra série baseada em fatos reais, sobre o Unabomber. Porque, pô, se séries sobre crimes e julgamentos já são bacanas, crimes sobre crimes e julgamentos que aconteceram de verdade prometem ser ainda melhores. 
Eu não me lembrava muito do Unabomber. Na minha cabeça, misturei com o caso da anthrax, mas isso aconteceu muito depois, em 2001 (cinco pessoas foram mortas ao receberem cartas com a bactéria). O Unabomber foi (é, está preso desde 1996) um terrorista americano que, entre 1978 e 1995, mandou 16 pacotes com explosivos para várias pessoas, matando três e ferindo 23. Foi também o caso mais longo e mais caro do FBI.
Ted Kaczynski, o tal terrorista, hoje com 76 anos, foi uma criança-prodígio com QI altíssimo. Entrou em Harvard com apenas 16 anos, formou-se em matemática, fez mestrado e doutorado na Universidade de Michigan e depois, com 25, foi o professor-assistente mais jovem do departamento de matemática noutra universidade conceituada, Berkeley. Mas em 1969 largou tudo e voltou pra casa dos pais. 
Dois anos depois, foi morar sozinho numa cabana sem água nem eletricidade no estado de Montana. Em 1978, enviou sua primeira bomba pelo correio. A terceira bomba que mandou, em 1979, felizmente falhou. O pacote foi aberto em pleno voo da American Airlines. Se a bomba tivesse funcionado, derrubaria o avião.
Kacynski culpava a sociedade industrial pelo declínio do mundo. Defendia que todos fossem viver numa cabana no meio do mato. Detestava a tecnologia.
Ted na vida real com seu
irmãozinho, em 1952
Como tantos serial killers, ele odiava também as mulheres. A série (mais especificamente o sétimo episódio, que lida com as origens do Unabomber) mostra que ele tinha um melhor amigo quando era criança, e que esse amigo o abandonou ao chegar à puberdade e arranjar uma namorada. Ele também criticava severamente o irmão mais novo por ter se casado, por ter se deixado prender. Chamava todos de "gado", "ovelhas" (parece familiar?). E era o que hoje seria chamado de incel (celibatário involuntário). Nunca transou, nunca namorou. Saiu com uma moça do trabalho uma vez, que não quis mais saber dele. Então, ele espalhou bilhetes no escritório chamando-a de vadia e afins. Foi despedido. 
Enquanto eu via a série, pensava em como esses mascus são parecidos (tirando a parte do alto QI). Não por acaso, o Unabomber é um ídolo pra eles -- assim como todos os serial killers. Eles se sentem únicos e especiais num mundo que os ignora, e fazem tudo para chamar a atenção. Incapazes de qualquer tipo de autocrítica, culpam as mulheres por tudo que há de ruim em suas vidas.
No fundo, a série é muito mais sobre a vida de um agente do FBI, Jim Fitzgerald (interpretado por Sam Worthington), que sobre Kacynski (feito por Paul Bettany). Mostra a obsessão do agente em tentar descobrir e capturar o serial killer, analisando principalmente a linguagem dos manifestos e cartas que Kacynski escrevia (pra quem é de Letras, é um prato cheio, apesar da série sugerir que o agente praticamente inventou a linguística forense -- uma ferramenta de identificação baseada na crença que cada pessoa tem sua maneira de se expressar, e que esta característica é tão única como suas impressões digitais ou DNA --, o que obviamente não é verdade). A família de Fitzgerald o larga após anos de negligência, e ele acaba se tornando tão recluso quanto seu alvo.
Embora o agente Fitz exista na vida real, o resto é liberdade poética. Mais de 150 agentes do FBI atuaram no caso, e Fitz foi apenas um deles, longe de ser o mais importante. Ao contrário do que mostra a série, Fitz e Kacynski nunca se encontraram, nunca se falaram, nunca desenvolveram qualquer tipo de relação. O Fitz da série representa vários personagens em um (e, ironicamente, esse protagonista ficcional se sente injustiçado ao não ser reconhecido como o homem que prendeu o Unabomber).
Mas o que me deixou com o cabelo em pé é como as mulheres são menosprezadas, mesmo numa série que toma tantas liberdades com os "fatos reais" em que diz se basear. No quinto episódio, vemos uma outra agente, Tabby (Keisha Castle-Hughes), ser fundamental para se chegar à identidade do Unabomber. É ela que vê e investiga uma ficha enviada ao FBI e a manda a Fitz. E aí, em vez de ser aplaudida (sem ela o FBI não chegaria a Kacynski), ela é punida por quebrar o protocolo. A série falha ao demonstrar essa injustiça como algo pessoal, não como um modus operandi histórico de como mulheres são varridas pra baixo do tapete da história. 
Outro exemplo é que, apesar do FBI ter investido tanto tempo (quase 20 anos) e dinheiro para desvendar o assassino, a descoberta só se deu por causa da cunhada de Kacynski. Foi ela quem leu o manifesto publicado no Washington Post e pensou, "Putz, esse Unambomber é Ted, meu cunhado!". Foi ela que contou isso pro seu marido David e insistiu, porque o irmão não queria acreditar nisso de jeito nenhum. Mas quem ficou com a glória de ser visto como o grande herói americano que denunciou o próprio irmão em nome da lei? David. 
Uma outra linguista que ajuda Fitz (uma personagem mal explorada pela série) também fica sem crédito algum. E assim são feitas as lendas sobre os corajosos e brilhantes homens que capturam outros homens que usaram suas mentes brilhantes para o mal.
Eu gostei da série e a recomendo (é muito superior à outra série recente baseada em fatos reais, Waco, sobre outro caso emblemático nos EUA). Foi legal relembrar o Unabomber e compará-lo aos terroristas mascus. Veja sabendo que ela não está tão preocupada com os "fatos reais" e que, mais uma vez, as mulheres não recebem importância, e isso não é apontado como errado. 

19 comentários:

Kasturba disse...

Lola, uma serie que eu estou simplesmente amando é Gracie & Frankie. É uma serie de comédia, leve, pra vc assistir e ficar relaxada.
A historia se trata de duas vizinhas cujos maridos, que trabalham juntos, resolvem assumir sua relação de mais de 20 anos, deixam as esposas e vão morar juntos, como um casal gay.
As duas então decidem ir morar juntas também, como amigas.
Achei fantástico, no meio de tantas séries e filmes que glamourizam somente a juventude e tratam mulheres como ornamentação, essa série vir com suas duas protagonistas mulheres com mais de 70. E elas não se resumem a senhorinhas que vivem em função de filhos e netos: Pelo contrario, têm vida própria, desejos, ambições como qualquer pessoa. Em certo ponto namoram, mas suas vidas de forma alguma for em torno de homem algum.
Enfim, to adorando, e recomendo pra quem gosta de comédia que não seja esses pastelões cheios de estereótipos toscos...

Anônimo disse...

Lola, você já assistiu Megamente?

Se nunca ouviu falar eu recomendo fortemente, é uma animação infantil da DreamWorks mas vale a pena analisar porque o principal vilão é um incel também que se acha um cara legal e se torna obsessivo por uma colega de trabalho que até é gentil com ele, mas só o vê como colega e isso o irrita tanto que quando ele consegue poderes destrói a cidade inteira e culpa a garota.

Anônimo disse...

Basta as mulheres criarem seus próprios estúdios cinematográficos, serem produtoras e criarem séries e filmes com ênfase em personagens femininas. Criem também empresas exclusivamente voltadas para o público feminino bem como focar sua produção nas especificidades das mulheres. As mulheres já demonstraram ter capacidade além de nós homens, só não entendo porque não alavancam isso de vez. Se são mais capazes, não há homem que as impeçam, na atualidade, de desenvolverem estes projetos.

Anônimo disse...

Bem observado Lola e os comentários foram bem pertinentes.

Inclusive também senti falta de negros homossexuais, parece até que eles não existem.

E não deixemos de mencionar os anões, os aborígenes, os navajos e tantos outros que também não participam.

Um absurdo


Anônimo disse...

17:33 - não é vc quem tem q nos dizer o q fazer, seu imbecil, até pq isso já está acontecendo, energúmeno

Anônimo disse...

Menos Unabomber.

Mais Valerie Solanas.

titia disse...

Esses caras são engraçadinhos demais. Quando reclamamos sobre representatividade, eles mandam a gente deixar "seus" redutos em paz e criar os nossos próprios, com liberdade pra fazermos o que quisermos, escrever histórias sobre o que quisermos no caso, etc. Mas basta abrir um espaço de diálogo em que eles não são o foco que fazem chilique, veja-se o blog da Lola. Organizaram um Camp Rock exclusivo pra meninas, e olha os chorõezinhos reclamando. A princesa é resgatada por outra mulher ao invés de pelo príncipe (Malévola) e já estão chorando "misandria!". Página de humor no facebook onde as babaquices deles são zoadas (eu daria uns exemplos, mas sei que a mascuzada vai correr fazer bot pra denunciar e tentar derrubar) o que mais tem é chororô de macho se doendo porque, ei, as atitudes deles são mega escrotas mas isso não significa que podemos criticá-los! Até da falta de vontade das mulheres de se relacionar e ter filhos eles reclamam! E se elas quiserem casar e ter filhos reclamam também. Oi, coerência, alguém aí já tentou olhar no dicionário pra ver o que significa?

A verdade é que eles nunca estarão satisfeitos independente do que as mulheres façam. Façam um favor a vocês mesmos e a nós, coleguinhas: comprem uma boneca inflável, contratem uma diarista e se isolem do resto do mundo nos seus porões. Assim todo mundo fica feliz, ok?

Anônimo disse...

Rsrs...não...não está. Nem acontecerá...

Anônimo disse...

Nós aqui discordamos da posição da Lola quanto a esse caso.

Anônimo disse...

Não está e não vai só porque um bosta idiota irrelevante de um mascutroll anônimo está cacarejando... vai nessa.

Anônimo disse...

Foda-se você... "nós" kkkkkkkkk muito desesperado querendo fazer acreditar que são muitos kkkkkkk

Anônimo disse...

Nós, no caso, refere-se a nós, grupo de alunos da escola estadual de Ensino Médio Dom Henrique Ruth, de Cruzeiro do Sul / AC, em conversa em grupo sobre o assunto. Exigimos respeito quanto às respostas. Essas atitudes agressivas e preconceituosas de pré-julgamento não ajudam em nada.

Anônimo disse...

Nós, os verdadeiros alunos da escola estadual de Ensino Médio Dom Henrique Ruth, somos leitores do blog da Lola e concordamos com 95% do que ela fala. Não aceitamos que um troll anônimo fale por nós.

Anônimo disse...

Ah tá kkkkkk a gente (risos) finge que acredita, troll que gosta de se passar por crianças (a mentalidade mirim de criança mimada pelo visto não muda, mas o corpo com certeza é de adulto)

Anônimo disse...

Não sei de que turma ou período vc é, mas na nossa turma a maioria discordou, sobre ESSE assunto em particular. Quanto a outros assuntos, não estão em pauta no momento.

lola aronovich disse...

Como você é ridículo e patético, troll das 19:28 e 19:54. "Vocês" da Escola Estadual se reuniram e chegaram à conclusão que discordam de mim? Quando? Qual turma? Teve ata da reunião?
E o mais importante: discordaram do quê? Não é estúpido escrever "discordamos" sem apontar o quê?
Você fez a mesma coisa em outra caixa de comentários, ô mascutroll. Não cola. Admita que sequer leu o post para escrever seu comentário idiota.
A propósito: não falei em momento algum que eu sairia do Brasil se Bolsonaro ganhar. Você que inventou isso.
E vc é tão ignorante que não percebeu que quem falou que Bolsonaro pode ganhar as eleições ("Em tempos de frágil democracia, com o Brasil em época de eleições e à beira de ver como chefe do Executivo um homem fascista, misógino e racista...) não fui eu, e sim a pessoa que escreveu o guest post. Qualquer leitura minimamente cuidadosa do texto vê que a voz na introdução ao texto é minha, e que o restante do texto é de uma convidada. Mas, lógico, precisa LER o texto pra sacar isso.

Anônimo disse...

O marmanjo mascutroll com cabeça de pirralho mimado acha que pode exigir o que quer que seja kkkkkkkkk kkkķkkkkkkkkkk

Anônimo disse...

O Unabomber, Ted Kaczynski, na verdade é um fetichista autoginefílico esquizofrênico que queria ser mulher e redireciona o ódio extremo que ele tem de si mesmo contra outras pessoas e a sociedade.

https://www.washingtonpost.com/archive/politics/1998/09/12/gender-confusion-sex-change-idea-fueled-kaczynskis-rage-report-says/eb33b946-8595-427d-af4c-9ccaada45935/


CONFUSÃO DE GÊNERO, IDEIA DE MUDANÇA DE SEXO ALIMENTOU A FÚRIA DE KACZYNSKI, DIZ RELATÓRIO

Por William Booth
12 de Setembro de 1998

Condenado Theodore J. Kaczynski, o Unabomber, considerou fazer uma operação de mudança de sexo quando tinha vinte anos e sua confusão sobre sua identidade de gênero o encheu de uma raiva que contribuiu para sua onda de bombardeios, de acordo com documentos divulgados hoje.

[...]

A avaliação psiquiátrica concluiu que embora Kaczynski sofresse de esquizofrenia paranóide, ele era mentalmente competente para ser julgado. O juiz ordenou que Kaczynski não pudesse representar a si mesmo, porém, decisão polêmica que ainda pode ser contestada por Kaczynski.

Na avaliação psiquiátrica, Johnson revela que Kaczynski tinha fantasias sexuais persistentes e intensas sobre ser mulher. Quando ele era um estudante de graduação na Universidade de Michigan em 1967, ele foi a um psiquiatra para discutir seus desejos de uma operação de mudança de sexo. Mas na sala de espera, ele decidiu que não poderia seguir em frente. Em vez disso, disse ao psiquiatra que estava deprimido com a possibilidade de ser convocado.

Sua quase confissão de seus sentimentos o encheu de raiva, neste caso dirigido a psiquiatras, que ele passou por uma grande transformação.

"Quando me afastei do prédio", escreveu Kaczynski em documentos divulgados hoje, "fiquei enojado com o que meus desejos sexuais descontrolados quase me levaram a fazer. E me senti humilhado e odiei violentamente o psiquiatra. Veio um grande ponto de viragem em minha vida. Como uma Fênix, eu saí das cinzas do meu desespero para uma gloriosa nova esperança."

A nova esperança de Kaczynski? Descarregar sua raiva em outras pessoas, incluindo o psiquiatra. "Eu vou matar", escreveu Kaczynski. "Mas vou fazer pelo menos algum esforço para evitar a detecção para que eu possa matar novamente."

A avaliação também afirma que Kaczynski estava extremamente zangado com sua família. Além disso, conclui que muitas das visões antitecnologia de Kaczynski foram desenvolvidas quando ele era jovem e continuaram essencialmente inalteradas. Kaczynski, em seu famoso manifesto e em outros escritos, criticou a sociedade tecnológica e disse que acreditava que essas forças roubariam a liberdade e dignidade da humanidade.

O relatório psiquiátrico concluiu que Kaczynski "interligou seus dois sistemas de crenças, que a sociedade é má e ele deve se rebelar contra ela e sua intensa raiva de sua família por suas injustiças percebidas. Ele fala abertamente sobre sua capacidade de direcionar sua raiva de um conjunto de ideias para o outro com fluidez."

Fábio Marques disse...

Excelente texto, Lola. Estou ainda terminando a série e esse protagonismo forçado do Jim também me incomoda demais. Recomendo ver o documentário sobre o Unabomber que também está disponível na Netflix. Para mim; ao ver o documentário, fica evidente que Linda Patrik é que realmente foi alguém com bastante convicção e perseverou em tentar mostrar para seu marido David, irmão do assassino em série, que Ted Kaczynski tinha graves problemas psicológicos. Se não fosse por Linda Patrik, talvez o Unabomber tivesse saído impune.