quinta-feira, 7 de agosto de 2008

BLOGUEIRAS E TROLLS

Tá, isso é antigo na blogosfera americana, aconteceu no ano passado, mas o que posso fazer se sou lerdinha e só fiquei sabendo agora? Tenho que contar.
Observe bem essa foto. É de uma reunião que o ex-presidente Clinton teve com um grupo de blogueiros americanos. Em frente dele há uma moça jovem, percebeu? O nome dela é Jessica Valenti, e ela é a principal editora de um dos maiores blogs feministas da internet, o Feministing, que recebe cerca de 25 mil visitas por dia. Ok, agora que você já sabe, olhe pra foto de novo. Vou ajudar pra que você veja melhor.
E aí, deu pra notar? “Notar o quê, criatura?”, você pode perguntar. Ué, notar que 1) a Jessica é praticamente irmã gêmea da Monica Lewinski; 2) ela está usando uma blusa insinuante, que realça seus seios; 3) ela está fazendo pose pra seduzir o Bill, e 4) o ex-presidente tá mais corado que o normal, provavelmente porque reparou nos atributos da moça assanhada. Gente, é sério! Dezenas de blogs atacaram Jessica por causa desta mesma foto que você está vendo aqui. Até alguns blogs de mulheres gritaram que uma feminista de verdade não deveria jogar seus peitos assim, pra cima de um político poderoso. E como que ela podia ficar exibindo os peitos dessa forma despudorada? Pois é, feministas têm seios! Ela deveria tê-los guardado em casa antes de dirigir-se à reunião, ora!
Em abril do ano passado, a mesma Jessica escreveu um artigo bem interessante pro The Guardian: “Como a Internet se Transformou num Paraíso Machista” (em inglês), em que ela fala sobre como, no começo da web, existia a utopia de que a internet seria um lugar livre e aberto em que as pessoas trocariam idéias sem ódio. Infelizmente, hoje a internet é um passeio pros bullies, que podem insultar anonimamente todas as minorias – aquelas que eles não teriam coragem de ofender na vida real. E quem paga mais o pato? As mulheres, claro.
Uma pesquisa indica que, ainda que uma mulher não tenha um blog, se ela sequer fizer comentários em blogs alheios usando um nome feminino, tem 25 mais chances de ser ofendida que um usuário com nome masculino. Isso independente dos comentários que fizer. Ou seja, ela será atacada simplesmente por ser mulher. E os ataques dirigidos a mulheres também são diferentes dos ataques aos homens. Homens não são chamados de vadia, prostituta, mal-amada, e feia. Nem ameaçados de estupro.
Até agora, por sorte, ser hostilizada desse jeito não faz parte da minha experiência internética. Mas eu fico pensando quem são os trolls que usam a web para ofender mulheres. Podem ser outras mulheres, escondidas atrás do anonimato? Até podem. Mas por que fariam isso? Eu entendo que uma mulher possa “xingar” outra de gorda. Mas será que ela realmente conseguiria escrever pra outra: “Tomara que você seja estuprada e retalhem o seu rosto, sua vadia!”? Acho bem difícil. Eu tendo a achar que a maior parte dos trolls é composta por rapazes com muito tempo livre. Meninos que odeiam que as gostosonas da escola não lhe dêem atenção, ou que têm raiva de suas mães por mandarem neles. Não sei. De todo modo, é por isso que não compartilho da opinião esperançosa que li nos comentários de mais de um blog (brasileiros e americanos) de que, quando as pessoas com mais de 40 anos morrerem, o mundo será lindo, porque as novas gerações de homens e mulheres não são preconceituosas. Hã? Então os trolls que escrevem atrocidades têm todos mais de 40 anos? Ou no fundo os meninos-trolls racistas, homofóbicos e misóginos não pensam assim de verdade, e só estão de brincadeira? O New York Times acabou de publicar um artigo imenso sobre os trolls, em que compara alguns sites abertos para anônimos a portas de banheiros públicos – todo mundo pode entrar e deixar a besteira que quiser. Ah, então é como trote? (outra doença social que nunca entendi).
Eu tenho a impressão, também, que os bullies e, por consequência, os trolls, são piores nos EUA que no Brasil, já que os americanos são mais competitivos e bélicos que praticamente qualquer outra nacionalidade no mundo (tanto que não temos palavras em português para esses termos, bullies e trolls). Mas pra mim não resta dúvida que, tanto na internet quanto na vida real, as mulheres levam a pior como as vítimas preferenciais dos trolls.
Pra combater isso (espero), blogueiras brasileiras estão organizando um Luluzinha Camp, que vai se realizar em São Paulo no dia 23 de agosto. Fico feliz com a idéia e adoraria participar, mas não vou poder, já que acabei de voltar de viagem. Torço pra que seja um sucesso e a primeira de muitas reuniões (e que elas não percam tempo falando apenas de maquiagem). Porque o caso Jessica pode nos ensinar algumas lições de como é duro uma mulher ser levada a sério.

13 comentários:

Anônimo disse...

Pessoas preconceituosas também são pais e mães e passam isso para os seus filhos, com certeza. Parece uma piada dizer isso mas a sensação é de que racismo e preconceito crescem cada vez mais. Muita gente gosta de cultivar ódios. O que essas pessoas fazem com as suas vidas para chegarem a esse lado negro não sei. O mundo tá cheio de gente má, de coração podre, capaz de esquartejar mulheres em não sei quantas partes. Para essas pessoas é melhor desejar a volta de Hitler do que de Jesus Cristo. (ok essa foi demais também, mas o que essa gente proclama é doentio).

Kenia Mello disse...

Oi, Lola.
Respondendo ao seu comentário lá na Denise, resolvi comentar aqui também e dizer que gostei muito do seu cantinho.

Realmente não é fácil ser mulher, é matar um leão todo dia, além de ser um alvo constante num mundo (real ou virtual) notadamente machista.

A esperança que tenho é que as futuras gerações sejam mais sensíveis às diferenças em função da educação focada na igualdade de gênero que nós, mães e pais de hoje, procuramos dar.

Beijo.

lola aronovich disse...

Cavaca, às vezes eu também tenho essa sensação que o preconceito cresce ao invés de diminuir. Espero que seja só sensação mesmo. O mundo seria tão mais gostoso sem ódio e preconceito! O artigo do NY Times que cito aí entrevista alguns trolls americanos. E a justificativa deles para espalhar ódio e fazer vítimas (porque eles são hackers tb) é que "na vida real o mundo também é difícil". Um desses trolls foi abusado sexualmente quando criança. O outro odeia os pais, e acha que através do ódio pode mudar as pessoas. É gente bem complicada. Precisa de tratamento urgente!

lola aronovich disse...

Kenia, que bom vc ter aparecido por aqui! Visitei o seu blog e deixei lá um comentário. Temos umas coisinhas em comum..
Ah, eu não quero matar leões, porque adoro felinos e animais em geral, menos insetos. Mas realmente, não é fácil ser mulher num mundo tão masculino. Só que, apesar de tudo, eu não gostaria de ser homem. Quer dizer... Talvez só por uns dias, pra ver como é. Sei que deve ter muito mais vantagens fora fazer xixi em pé! Não sei no blog de quem li que, ao invés de Dia das Noivas e essas frescuras que inventam pra gente, a gente deveria ter direito a um Dia dos Homens, isso sim! Pra ver como é bom.
Eu confio em mães como vc, a Denise, a Suzana, e várias outras mães blogueiras pra educar suas filhas a ser mais livres.

Kenia Mello disse...

Oi, Lola.
Já adicionei você, o prazer é meu em fazê-lo!

E, sim, 8 de abril de 67! ;)

Beijo.

lola aronovich disse...

Ahá, Kenia, logo vi que vc era muito mais velha do que eu! Dois meses mais velha! Eu sou de 6 de junho de 67. Safra boa essa de 67, não é por nada não. Abração!

:-P disse...

Lola, mulheres também atacam muito outras mulheres. Se você não liga, se vc liga, se você reclama ou não reclama, tem sempre uma pra te apontar o dedo. Eu já chamei mulher de vadia, mas vá um homem chamar uma mulher assim.Não deixo, acho que é tipo: os meus xingo eu. Horrível, mas verdade.

Já passei de tudo por ser filha de estrangeiros, por ser cigana, por ser judia - é, fia, só faltava ser gay e negra. :-P O mais complicado é ver que quem eu achava que deveria ser mais solidário, na verdade é quem mais me apunhala.

Eu sei, não está fazendo muito sentido. Mas juro que um dia te explico.

Beijos

Anônimo disse...

Oi Lola! Impressionante mesmo como as pessoas vêem o que querem. Mesmo que a tal da Jéssica estivesse se insinuando, eu acredito que isso diz respeito apenas a ela e à pessoa que ela (supostamente) está tentando seduzir. Algumas pessoas se ocupam demais com as vidas alheias.
Sobre a internet, eu acho que é um espaço de troca legal, mas que traz consigo riscos muito grandes. Eu nunca sofri ofensas como essas que você colocou no post, mas já fui vigiada, o que me fez deletar blog, orkut e msn. Alguém sabia exatamente onde eu estava, quando, com quem e fazendo o que. Eu nunca publiquei informações desse tipo na internet, nem mesmo no orkut, mas penso que mesmo o fato expor minhas fotos no blog poderia ser usado contra mim. A pessoa ligava na minha casa e ficava dizendo ao meu marido que ele era "corno" e essas coisas agradáveis de se ouvir. Depois, pensei muito e resolvi retomar minhas atividades internéticas. Porque, por mais desagradável que seja, não posso mudar (completamente) meus hábitos por causa de uma pessoa lunática que não tem mais o que fazer.

Beijoca.

lola aronovich disse...

É verdade, Malena, que mulheres atacam muito outras mulheres. E acho que fazem mais patrulhamento para que as mulheres se encaixem num só padrão de beleza que os homens. Mas imagino que haja muito menos mulheres no mundo que sejam trolls, hackers, e bullies e que passem trotes que homens. É essa a minha impressão.
Mas acho que ajudaria se termos ofensivos às mulheres, como vadias, fossem deixados de ser usados por mulheres (e homens, claro). Um homem que chama uma mulher de vadia não ouvirá o mesmo insulto. Mas, pra uma mulher que chama outra de vadia, o insulto é fácil de voltar. E como é um termo que julga a sexualidade de uma mulher (que já tem sua sexualidade julgada de várias formas), seria bom que fosse banido. Em geral, eu não suporto quando um grupo constantemente discriminado como as mulheres pode continuar discriminando quem quer que seja. Estamos todas no mesmo barco, pô! Mas um dia vc se explica, Ma!

lola aronovich disse...

Juliana, que coisa terrível! Teve um stalker atrás de vc?! É, eu acho que se houvesse alguém que soubesse aonde estou a cada minuto e ficasse ligando pra casa pra me insultar, talvez eu desse um tempo da internet, porque essa experiência deve ser muito desagradável. E o pior é que deve ser fácil de fazer também, pra quem tem as manhas. No artigo do NY Times o autor fala de trolls que no fundo são mais que trolls - são stalkers e hackers. O preju passa a ser financeiro também quando alguém sabe o número do seu social security number (dá pra fazer muita coisa com esse número, pelo que vi), do seu cartão de crédito... Mas eu tenho fé na humanidade e acho que pessoas doentes assim, sem vida própria, que passam os dias atrapalhando as vidas de outras pessoas, são a minoria. Espero que esse pesadelo na sua vida tenha passado. Abração!

Anônimo disse...

confirmo, usei um pseudónimo masculino durante algum tempo e pude constatar que as minhas opiniões eram muito mais respeitadas quando me apresentava como homem.

o que mais me doeu foi que tinha um número de leitoras que 'me' adoravam mas só até ao momento em que descobriram que eu era uma delas...

eu escrevia sobre muita coisa, por vezes sobre a opressão que as jovens sofrem por parte dos namorados, só uma mulher poderia escrever assim e os meus leitores mais inteligentes perceberam sozinhos isso mesmo.

outra coisa que noto é que, por assinar no feminino o tom das críticas é, muitas vezes, de um paternalismo insuportável, e também já fui alvo de ofensas dirigidas às mulheres e de insinuações torpes.

lola aronovich disse...

Sarah, perfeitas as suas colocações. Que interessante que vc tenha passado por isso. Deve ser uma experiência muito educativa. Eu até gostaria de tentar me passar por homem algumas vezes, pra ver como seria a reação, mas não acho que conseguiria. No primeiro parágrafo já notariam que sou mulher e feminista!
Mas muitas vezes posso observar como blogueiros/as que respondem os comentários de seus leitores/as tratam de forma diferente leitores e leitoras. Muitas blogueiras são muito "fofas" com seus leitores masculinos. Às vezes eu tenho que me policiar pra não agir assim tb, mas não sei, há leitores/as com quem eu tenho mais intimidade, porque comentam mais, e outros, menos. Mas, por exemplo, tem um colunista sexual americano que eu não gosto muito (gostei quando o descobri), e ele responde cartas de leitores/as. Precisa ver como a diferença de tratamento é gritante! Mulher ele espinafra mesmo. E ele é gay! Detesto quando uma minoria discrimina outra.
Enfim, eu não sou a pessoa mais observadora do mundo, to put it mildly, mas se até eu noto a diferença no tratamento às vezes, é porque ela deve existir...
Apareça sempre, Sarah!

Anônimo disse...

cara lola:

não é por acaso que, em muitos blogs raramente aparecem comentários com nomes ou nicknames no feminino.

repare, eu escrevo muitos comentários neste blog inglês:

http://www.hurryupharry.org

repare nos comentários sexistas de um leitor que assina John P.

http://www.hurryupharry.org/2008/08/11/sex-assault-victim-arrested/

esse senhor não resiste a fazer comentários pejorativos em relação ao que eu digo. também faz comentários desagradáveis a outrso comentadores, mas em relação a mim usa o facto de eu ser mulher de uma maneira muito suja.

eu não me importo e até faço por o provocar, para que fique o seu comportamento fique claro junto dos outros leitores.

a experiência de escrever no masculino foi muito boa.

não vou repetir porque um dia um blogger que conhecia a minha verdadeira identidade denunciou-me no seu blog em termos muito ofensivos para a minha dignidade de mulher, com o objectivo de me prejudicar profissionalmente.

ou seja, a pessoa sabia o meu nome porque tínhamos comunicado através de email.

quando descobriu a minha profissão e o meu emprego, resolveu vingar-se de alguns comentários contrários às suas opiniões que eu tinha escrito.

não me prejudicou, e com isto eu aprendi a nunca mais usar nick names. seja como for tudo o que eu escrevi com nick name correspondia a ideias que eu assumo como minhas.

mas a verdade é que mesmo na internet as mulheres são mais vulneráveis a ataques pelo simples facto de serem mulheres.

gostei muito do seu blog, vou linkar, isto dos blogs permite-nos comunicar com pessoas de regiões às quais de outra forma não teriamos acesso.